30 janeiro 2008

"Eu, gênio."

Hitler deve ser o sujeito com a pior fama em todo o universo. É a personificação do Mal.

Mas, na verdade, pessoas como nosso estiloso doutor sabem q "o Mal" não é tão ruim assim. Uma pesquisa qqer, de qqer tamanho, há de revelar q as pessoas identificam o Mal com uma intenção de causar dor ou de fazer outras coisas desagradáveis tais como destruir o q já está pronto. Mas, dado q se procura combatê-lo com preces, esperanças e "o poder do amor", ninguém deve levar o Mal muito a sério. No mínimo, não é tão temido ou detestado qto se quer fazer crer. Hitler é considerado mau não porque tivesse intenção de fazer o Mal, mas porque agiu com indiferença e foi, em retrospecto, incompetente.

Ninguém teme o Mal tanto qto teme a Indiferença. Ninguém detesta o Mal tanto qto detesta a Incompetência. Não fosse assim, ¿por que cargas d'água teria surgido a eugenia?

Até um paracelso do darwinismo como Richard Dawkins chegou a dizer q Hitler, além de tantas maldades, também teve a desfaçatez de desabonar a eugenia. Pra Dawkins, a equação pós-Hitler q ficou na cabeça das pessoas é:

Hitler = o Mal
Hitler = eugenia
portanto, eugenia = o Mal

Um sujeito inteligente como Dawkins não cometeria a estultícia de aventar a eugenia seriamente. Mas, como biólogo, ele não acha essa uma idéia tão ruim. É antipática, desagradável, mecânica e idealista, mas não de todo ruim. Pois ¿não é eugenia o q se faz com os rebanhos, os bichos de estimação e os vegetais? Se existe o objetivo e a esperança – com a qual gente tão desenganada como Freud morreu e morre – de "uma vida melhor" no futuro, ¿por que não já garanti-la ceifando na raiz "a origem de todo o Mal", isto é, "as gentes de baixa qualidade"?

O Dr Plausível, claro, cai no gargalho. A eugenia como método acabaria sendo só mais um passatempo humano, tal como as religiões e as ideologias políticas – nas palavras de Arundhati Roy, "an obstacle race, with a prize at the end". Mas, embora risível, não é essa a característica hilariante.

Hilariante é q instituir a eugenia é totalmente desnecessário. Basta estigmatizar o estupro: homens e mulheres, em suas próprias escolhas, já promovem a eugenia conscientemente e de comum acordo; o estupro é a única situação em q o desejo eugênico bilateral é contrariado por uma das partes. E embora as mulheres disfarcem suas imperfeições sob a maquiagem, a roupa e a plástica, e os homens disfarcem as suas sob a organização, o método e a hierarquia, e muito embora o jogo da sedução seja, como sempre foi, um palco de enganações, fingimentos, bom-mocismos e hipocrisias, a natureza se encarrega de eugenizar a população bonitinho e com mais eficácia do q qqer racionalização a priori conseguiria.

Em resumo: os indiferentes e os incompetentes – não os maus – vão sendo ceifados, implacavelmente.

21 janeiro 2008

Sucho de frutha em thela de cinemha

The silly people don't know their own silly business.
Henry Higgins, in Pygmalion, GBShaw


Tá cada vez mais impossível ir ao cinema com nosso esfuziante doutor sem passar alguns momentos gargalhando. Se não é o preço do ingresso, é o da pipoca; se não é no trailer, é na publicidade pré-filme; se não é na primeira metade do filme, é na segunda. Vou te contar, viu. Alguns cinemas já nem se incomodam de passar os trailers: passam logo a publicidade, na certa porque paga mais. Ou seja, é q nem tv a cabo: vc paga os olhos da cara pra ver anúncios. O doutor já cancelou a tv a cabo, mas ainda vai ao cinema. Logologo vai desistir também do telão e virar usuário de pirataria.

Sesdias, sua liberdade de escolha foi funestamente pisoteada por um anúncio desse suco-novo-igual-aos-velhos — Fruthos. O doutor desandou a rir e gargalhar e expectorar e, é claro, o cinema todo riu junto... e, é claro, pelo motivo errado. Veja o estopim aqui:



¡Ô miasarma! ¡¡Ôôôôô miasarma!!

É assombroso o estrabismo desse anúncio. Tira sarro de gente q não pensa e está obviamente dirigido à mesma gente q não pensa. É o mesmo q dizer:

"Ô idiota, deixa de ser idiota seguindo as modas inventadas por nutricionistas. Prefira ser idiota seguindo a moda inventada por NOSSO nutricionista."

HAHAHAHAHAHAHAHA

E ¿¡¿¡¿"frutas colhidas com todo carinho"?!?!?

HAHAHAHAHAHAHAHA

Acho q ninguém nasceu ontem, né? Imagina se o peão vai colher a laranja "com todo carinho", puxando do galho delicadamente pra não machucar a árvore, deitando a fruta numa caminha de cetim acolchoado... aiaiai... "Frutas colhidas com todo carinho"... êitcha. ¿Pra q catso serve uma frase dessas num comercial de suco industrializado se não pra estimular a idiotice do público?

A mensagem é tão despistada q talvez os próprios criadores do anúncio... ãã...

Deixa pra lá.

E ¿q catso tá fazendo esse H no meio de Fruthos? aiaiaiaiaiaiai

AI AI AI AI AI AI AI

Mas é sério, leitor. Pra quem já leu The Omnivore's Dilemma, de Michael Pollan, não há de escapar a cretinice do anúncio ao contrapor produtos naturais como alho, brócolis e peixe a um produto industrializado q — além do suco concentrado de praxe mais uma quantidade cinicamente viciante de açúcar — contém acidulante, estabilizante, antioxidante, nossa velha conhecida água e um composto tetricamente chamado de "aroma idêntico ao natural" — ou seja, um suco igualzinho a todos os outros sucos industrializados da prateleira q, pelo menos, não insultam a inteligência do povão.

Vida curta.

02 janeiro 2008

Troppi cuochi

Reunião familiar de fim de ano é qdo nosso elucubrante Dr Plausível fica meio largadão ali no canto da sala bizoiando a biblioteca da parentalha. Parente pode ser aquela água toda, mas poucas coisas há neste mundo injusto melhores q gargalhar honestamente com irmãos, primos e cunhados. Sesdias o doutor tava lá com uns parentes q assinam a Folha, todos exímios cozinheiros, e passou ótimos momentos gargalhando em família em volta duma amostra grátis q a Folha enviou duma coleçãozinha de receitas com o imaginativo, criativo e evocativo nome Cozinha de País a País.

O livreco em questão intitulou-se Itália 2 — ou seja, é o 2° volume dedicado à cozinha Italiana.

Mas, mas... receitas de ¿musse de damasco? (francês com chinês) ¿¿gazpacho?? (espanhol) risoto ¿¡¿ao curry?!? (indiano) O doutor chamou a parentalha em volta e daí em diante foi só risada.

Logo na intro, o texto já solta aquele cheiro de minestrone requentado de soborô insosso e mal cozido.

Veja esta amostra, sobre massa de macarrão:

A história ensina que as primeiras versões de massa a partir do cozimento da mistura de farinha e água, são do século 490 a.C. (1) ... Esse alimento mágico (2) rapidamente se difunde a ponto de, na Idade Média (3), revelar o status social de seus apreciadores (4). As massas frescas e recheadas eram típicas nas mesas dos ricos, enquanto as secas e planas ... eram encontradas nas mesas dos pobres. Apesar de tudo (5), um alimento revolucionário (6) e ao alcance de todos.

(1) Na verdade, o q a história ensina é q os chineses já comiam espaguete 2 mil anos a.C.

(2) ???? Súbito aparecimento do locutor da Globo.

(3) De 490 a.C. até a idade média são uns 1500 anos; ¿isso é "rapidamente"?

(4) Tipo, um pedreiro faminto de Sorrento comendo macarrão pq é barato e fácil de fazer virou "apreciador".

(5) O doutor e a parentalha ficaram vários minutos tentando entender o q é "apesar de tudo" nessa frase; ¿apesar de tudo o quê? ¿apesar de "revelar o status social"? ¿apesar de ser comido por ricos e pobres? ¿Q catso?

(6) HAHAHAHAHAHAHAHA Um alimento com uma tradição de uns 1500 anos devia parecer revolucionaríssimo na Idade Média. O próprio Marxcarrão.

Agora vejam estas delícias. Animam qqer jantar.

salada vegetariana de arroz
... Esta receita pode ser feita com arroz arbóreo ou com arroz comum, mas, se a ocasião for um dia especial, deve-se usar o arroz parboilizado.
HAHAHAHAHAHAHA
Ou seja, se for uma ocasião comum, use arroz arbóreo; mas se for especial, use um arroz q qqer restaurante a beira de estrada usa.

salada morna de couve-flor:
... Apesar de não ser originária da Itália, esta criação contemporânea é muito apreciada pelos italianos...
E apesar de não ser originária da Itália, é justamente por ISSO q foi incluída neste volume de cozinha italiana, capice?

nhoque com camarões
... a batata, q é outro ícone da cozinha italiana...
... E da alemã, da inglesa, da portuguesa, da boliviana, da canadense, da brasileira, da chilena...

tamboril com cítricos
... Ao contrário de muitos peixes, o tamboril não tem escamas...
É. Ao contrário dos muitos peixes q não estão entre os muitos peixes q NÃO têm escamas, o tamboril TAMBÉM não tem escamas.
Aliás, ¿esse "muitos" peixes dá a impressão de
a) mais de 50%, ou
b) menos de 50%?
Costuma ser menos pois, senão, dir-se-ia "a maioria dos peixes", não?

camarões aromáticos
... O camarão é um produto raro na Itália...
Mas tem tanto, mas TANTO italiano pedindo camarão qdo viaja pro exterior, cara. Nem te conto.

peru colorido
... Muito adequada a almoços informais que reúnam gente jovem e alegre...
¿Quê? ¿De volta aos anos 50?
"Ei, tchurma, já q somos um grupo de gente jovem e alegre, ¿q tal almoçarmos um peru colorido?"

musse de damasco
... O damasco é uma fruta originária da China e do Oriente Médio ... agrega sabor a esta musse...
Tendi. Vc pega uma sobremesa de origem francesa, coloca uma fruta chinesa e ¡presto! ¡pimpoglione! ¡sparadrappo! Sem falar q o damasco "agrega" sabor a esta musse q JÁ É de damasco...

frango à siciliana
... Atualmente, a Sicília é um dos maiores produtores de frutas cítricas (laranja e limão) do mundo. Estas frutas dão um toque de requinte a este frango...
¿Requinte? O Brasil é o segundo maior produtor de bananas do mundo. ¿Esta fruta dá um toque de requinte ao picadinho?

E por falar em banana...

torta de banana à italiana
... Na Itália, a banana é produto raro...
E é por ISSO q figura tão visivelmente na culinária italiana.

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O doutor tem um pouco de dó de jornal q tenta alavancar as vendas com ofertas desse tipo. E tem mais dó ainda da imprensa brasileira, q (como já se disse aqui) aparentemente não tem idéias, não tem redatores, não tem iniciativa. O comentário q fiz no início sobre o nome dessa coleçãozinha é mais sarcástico do q parece à primeira vista, pois a "Cozinha de País a País" é adaptada da idéia, redação e iniciativa do jornal espanhol El País. A Folha nem sequer teve a presença de espírito de adaptar o trocadilho do título (na Espanha, o leitor recebia um número da coleção a cada edição de domingo de El País — portanto, "Cocina de País a País").

Claro q a Folha não é o único jornal a enfiar gororobas editoriais goela abaixo dum público apéptico, sob a desculpa de "cultura" ou "informação". É apenas um exemplo. E fica bem evidente do quê é exemplo qdo se compara o produto ao eslôgã enganoso q o promove: (grifos meus) "Qualquer um vai poder ser especialista na culinária de qualquer país." Mesmo descontando o zeitgeist do Ratatouille, alguém no caminho entre a idéia original e o produto final obviamente agiu de má fé. Se não isso, então grande parte dos vários intelectos por trás dessa coleção e promoção ingenuamente desacreditam na capacidade q um texto seu tem de não significar nada.

27 dezembro 2007

O Natal do presente, aqui e agora

Todo o leitorado deste blogue deve bem imaginar o q diria nosso espectável doutor sobre o Natal: q é uma festa de origem pagã baseada no solstício de inverno, q pouco ou nada tem a ver com o nascimento de Jesus, q não é totalmente reconhecido pela cristandade, &c &c — coisas q muita gente sabe.

Outro aspecto muito lembrado é q trata-se do solstício de inverno no hemisfério NORTE, importado pra este hemisfério pelos descendentes de europeus q sabiam contar os dias mas ainda não estavam totalmente convencidos de q a Terra era redonda.

Enfim, todos imaginam q o doutor diria coisas do tipo.

Mas é no Natal q o doutor vê o q o Brasil realmente é. De fato, poucas ocasiões permitem q se veja isso com tanta clareza como a época em torno ao solstício de verão — em particular, viajando pelo interior do país.

O Brasil é um assentamento europeu — meio interrompido, meio largado, meio improvisado — no limiar entre a Europa e o desconhecido, entre a civilização e as terras de ninguém. O povo traz a Europa na bagagem ignorando q as culturas viajam bem na horizontal porém mal na vertical. É muito complicado.

Se jogar fora a bagagem é impossível, cada país precisa pelo menos fazer sua própria síntese. Nos Euá — um país q já amadureceu de sua adolescência de assentamento europeu e agora faz jus a sua independência —, a síntese foi adaptar um mito dinamarquês e criar o Papai Noel de hoje, absorvendo o visual dos tons vermelhos e verdes e... ¡pumba! descarregando anualmente dezenas de filmes com aqueles tons ironicamente idênticos aos da bandeira de Portugal.

Já o Brasil está longe de fazer sua própria síntese do Natal. Longe. Looooooooooooooooonge. Natalinamente, o Brasil é um mero derivado europeu terceirizado pros Euá. Os ideais natalinos são coados e diluídos progressivamente desde os centros europeus e euaenses até a mais longínqua colônia desbravadora do sertão mato-grossense, perdendo no caminho sua razão de ser e pintando o mundo com uma cor desconexa e desorientada.

¿Quer ver? Nem precisa ir tão longe.

Esta é uma pataquada q a Disneylândia fez pra este Natal:



Note o título dessa música — We’re All In This Together (estamos todos juntos nessa) — e os lugares-comuns da letra, tipo “everyone is special in their own way” (cada um é especial a seu modo).

¿Q raios?

Pois vendo o vídeo abaixo, do 1° Encontro de Papais Noéis de Guaramirim — uma cidade de 31mil habitantes em Sta Catarina —, essas palavras da Disney, os lugares comuns da co-operação e da boa-vontade, mudam de sentido e passam a soar cínicos, perversos e até um pouco sinistros:



¿Como assim, “we're all in this together/everyone is special in their own way”?

¡Homessa! É óbvio q não estamos todos no mesmo barco.

O Dr Plausível acha engraçadíssimo ver ex-portugueses, ex-italianos, ex-caboclos, ex-cafuzos e ex-mamelucos fardados de Papai Noel cozinhando sob o sol de dezembro em toda cidadezeca do Brasil. Mas é claro q este não é o único país do hemisfério sul a sofrer as babaquices de festejar o Natal seguindo a estética do outro hemisfério. Pra comparar, veja o desfile de Natal em Launceston, uma cidade de 71mil habitantes na Austrália — um país cuja população é mais ou menos a mesma da grande SPaulo.



E aqui, no mesmo desfile, uma banda de gaitas de fole tocando Jingle Bells. Vc pode até não gostar do som, mas pelo menos a banda é afinada e ensaiada:



Comparando as coisas, confirma-se q coreografias e comportamentos escriptados não são o forte do Brasil – mas, neste caso pelo menos, talvez porque o Natal tenha sido coreografado e escriptado lá onde o solstício do inverno é em dezembro. A maior parte do Brasil está entre o Trópico de Capricórnio e o Equador. A Europa e os Euá estão inteirinhos entre Trópico de Câncer e o Pólo Norte. Não tinha como dar em algo plausível.
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Adendo:

Prestando atenção nos vídeos, o leitorado há de notar três ironias totalmente involuntárias — do tipo q faz o doutor destroncar as costelas de rir.

(1) Apesar de a Disney insistir q “we're all in this together”, a bandinha de Guraramirim q aparece ao final toca em suas liras desafinadas aquela marchinha do Assis Valente cuja letra diz:

“Eu pensei q todo mundo fosse filho de Papai Noel.”

Só isso já garante uma gargalhada. Mas tem mais.

(2) A letra é sobre alguém q pede “felicidade” ao Papai Noel. Claro q esse presente ele não dá:

“Já faz tempo que pedi
Mas o meu Papai Noel não vem.
Com certeza já morreu
Ou, então, felicidade é brinquedo q não tem.”

E ¿essa música é tocada onde? onde? Claro, num encontro de Papais Noéis.

Por aí se atesta q brasileiro em geral não tem ouvido pra ironias. Mas há exceções. Essa música tem o sarcástico título Boas Festas.

(3) O sarcasmo do “boas festas” do Assis Valente é o cinismo do “happy holidays” da Disney.

Sabedores de q o solstício de inverno foi seqüestrado por cristãos, a Disney não pode desejar Feliz Natal publicamente sem ofender as minorias reclamonas de judeus, muçulmanos, &c, q também aproveitam o bonde do solstício. Note no vídeo q, depois q a rapaziada deseja “Merry Christmas”, ouve-se um “Happy Holidays” em off. Das duas uma: ou algum cristão atrevido cinicamente desviou a cena pra aparecer só o áudio; ou alguém cautelosamente enxertou o cínico “happy holidays” mais tarde, durante a edição de som.

E nos Euá essas coisas acontecem mesmo, acredite.

17 dezembro 2007

O purista

¿Viram só o decreto do Aldo Rebelo? ¡Q coisa, hem, gente?

Uma das entidades mais engraçadas em debate sobre línguas é o purista. É uma pessoa tão engraçada q faz rir até gente burra e/ou desinformada.

Purista é uma espécie de faxineiro de floresta. Vê um pozinho, uma sujeirinha, uma pocinha, e já quer passar um aspirador, um paninho, um rodo. Não admira q passe a vida a reclamar.

O purista vê na língua uma quantidade alarmante de galicismos e anglicismos. (Gozado q é sempre ou galicismo ou anglicismo; nunca é, digamos, niponismo — nunca sugerem 'suchí' ou 'chiátisso'.) E o purista é em tal grau tacanho q nunca sugere algo q preste. É sempre "Ah, não usa essa palavra, não. Usa essa outra aqui, que não é exatamente o que você quer dizer, mas pelo menos não é galicismo."

HAHAHAHAHA

¿Querem ver?

Aqui vão algumas frases usando as sugestões de puristas pra "corrigir" em português da gema certos galicismos:

carnê
Não esqueça de quitar teu bloco de prestações do IPTU.

controle:
É importante manter superintendência da taxa de colesterol.
Perdi o domínio remoto da tevê.
O Padilha assumiu o governo societário da firma.

dossiê:
O Ministério Público vai encaminhar a pasta da Colgate à Justiça Federal.

enquete:
Fizemos uma sondagem de opinião e, ¿quer saber?, ninguém acha.

envelope:
Coloquei a carta na sobrecarta errada.

greve:
Os pedreiros entraram em parede.

Só um gostinho. Já deu pra entender, né?

E não poderia deixar de citar um "anglicismo":

conforto (no sentido de "bem-estar físico"):
Depois q ganhou a mega-sena, ele vive com muito aconchego.

Nessas horas, é bom lembrar o q escreveu na década de 1880 o Aluísio de Azevedo, um escritor aparentemente dotado dum alto grau de plausócitos nas veias:

"A França é a sede do pensamento humano ... Como não havemos de ter galicismos? Como não havemos de adotar a França como senhora, se é ela quem nos dá os costumes, as lições, a nomenclatura científica, a literatura moderna, o realismo, o teatro, a arte, a política, o cancã e o deboche? Se é ela quem nos explica o que nós somos, o que são os fenômenos naturais que na história de Portugal se acham explicados pelo milagre; se é ela quem nos diz como devemos andar na rua, viver em casa, comer, beber, dormir e até multiplicar-nos; se é ela quem nos prescreve a moda, quem faz o caráter e os vestidos de nossa mulher e filhas, quem talha o pensamento e as fardas de nossos ministros de Estado, de nossos conselheiros, se é ela quem destrói as nossas crises políticas e as nossas dispepsias; se é ela quem nos dá os tratados de economia política e o xarope La Rose?!"

Troca 'França' e 'galicismo' por 'Euá' e 'anglicismo', e pronto: Aluísio de Azevedo redux.

12 dezembro 2007

A esperança como negócio (4)

Nosso empedernido doutor já tratou da esperancite na escala política nacional, mas é preciso dizer q essa doença −variante da hipoplausibilose− ataca no mundo inteiro. Ultimamente tá um tal de ter esperança na raça humana q vou te contar. Êitcha. Gente não aprende.

Na edição de 6 out último, a NewScientist publicou um artigo (q vc pode ler aqui) teressantíssimo sobre sustentabilidade. Diz q Cuba é (ainda) o único país q pode se gabar de promover um desenvolvimento sustentável. “¿Des. sust.? ¿Que porra é essa?” diriam meus leitores mais vicerais. Sei lá. Nem o artigo consegue definir direito. Mas dá pra entender, não dá? Si o planeta ¹aumenta o IDH −ou seja, a expectativa de vida, a alfabetização, a escolaridade e o PIB per capita−, ²usando menos de 100% de sua superfície pra alimentar a população, então dá pra ²sustentar o ¹desenvolvimento, não?

Mas aí os caras fizeram um gráfico pra responder ä pergunta: si fosse pra ter a população inteira do planeta com o IDH dos Euá ou da Europa ocidental, ¿precisaria da área de quantos planetas pra sustentar essa gente toda? Ou seja, já q só há UM planeta, cuja área não é extensível, ¿qual seria a população ideal pra preencher esses requisitos basiquérrimos do IDH? Veja o gráfico abaixo:



Lembrando q o IDH é o básico da vida digna e não as esdruxulâncias do conforto, pelo gráfico se vê q, pra q os 6,5 BILHÕES de coitados deste planteta tenham uma vida razoável, seria preciso ter quase 3 (três) planetas Terra pra sustentá-los no IDH da Europa ocidental e mais de 5 (cinco) no IDH dos Euá.

HAHAHAHAHAHA

Também se vê q, de todos os países com IDH maior q 0,8, apenas Cuba pode ser modelo de des. sust., pois si 6,5 BILHÕES de coitados vivessem no nível cubano, a gente só precisaria de 80% da superfície do planeta, deixando o resto pros outros bichos.

¿Não é hilariante, a esperança?

Depois, na edição de 27 out, um leitor (q provavelmente toma Plausibilol® regularmente) escreveu o seguinte:

«Se, tal como a maioria concorda, a população mundial chegar à 10 BILHÕES em 2070, será preciso ter 1,3 planetas pra sustentar o mundo todo mesmo q o IDH médio se restrinja ao de Cuba. ... Pra q o mundo todo vivesse tão bem qto se vive na Europa ocidental hoje, a população mundial precisaria ser de cerca de 2 bilhões.»

¿Não é de espapaçar os miolos?

E aí vem gente com toda aquela esperança. Alguém teria q sair piparoteando orelhas pelo mundo todo, mostrando q, mesmo sem fome, sem guerras, sem poluição, sem aquecimento global, simplesmente NÃO É POSSÍVEL q todos vivam ãã... “dignamente” — em particular, si o índice do “dignamente” aumenta à olhos vistos à cada vez q a tecnologia inventa mais uma geringonça, ou à cada vez q alguém desempacota mais uma teoria humanitária globalizante.

Não há o q discutir ou adicionar ä Teoria Econômica Plausível: a pobreza é o estado natural do ser humano, e o crescimento econômico depende da produção incansável de bebês pobres.

03 dezembro 2007

Hans Rosling e suas bolinhas amestradas

Li uma vez q o centro de São Paulo parece Nova Iorque em 1950. Hoje vi q o Brasil atual é o q era a Suécia em 1953.

Veja aqui.

Ou seja, tenha um filho agora e aposte em teu neto.

Se quiser ir direto à fonte, aqui está.

[Agradecimentos ao Barnabé.]

29 novembro 2007

Monumento dá bandeira

As a foreigner is very apt to conceive an idea of the ignorance or politeness of a nation from the turn of its public monuments and inscriptions, they should be submitted to the perusal of men of learning and genius before they are put in execution.
Joseph Addison, The Tombs in Westminster Abbey in "The Spectator", 30 de março, 1711


Nosso extracurricular doutor sempre sai de fininho qdo alguém começa a falar da "função da arte", ou F*art, mais conhecida como "fart": às vezes faz barulho, às vezes não faz, mas sempre cheira bem a quem a produz.

Mas...! como todo sábio, nosso exegético humanista sabe q arte pode não ter função, mas certamente tem conseqüências.

Pois se a arte usa símbolos, então esses símbolos têm significados, não? E, mesmo q não percebibos conscientemente, se os significados aparecem como símbolos, estes necessariamente sugestionam de volta aos significados, ainda q inconscientemente, ora pois não?

Então.

Desde criança, qdo nosso doutorzinho passava ao largo do Monumento às Bandeiras (MaB) recém-inaugurado, a caminho do Instituto Infantil de Plausonomia, alguma coisa naquele trambolho lhe parecia fora de lugar. Jendia, em respeito ao trabalhador paulistano, nosso sexagenário doutor evita passar perto, pra não engarrafar o trânsito com suas estrondosas gargalhadas, q fazem revoar os gansos do parque e contagiam os motoristas, q páram onde estão e riem sem saber do quê.

A hipoplausibilose galopante da primeira metade do século XX – q dizimou cérebros inteiros do 3° mundo – é a única explicação pra q um estorvo conceitual daquela enormidade tenha sido descarregado sobre esta valorosa cidade e sido ou pessimamente idealizado ou pessimamente compreendido, a tal ponto q jendia muito paulistano se orgulha do MaB, e nem levanta um pelinho do sobrolho qdo ouve os desavisados de plantão chamando-o de tudo qto é nome ufanista, tipo "emblema histórico e arquitetônico de São Paulo",
"a mais completa tradução da cidade"... ¡Ôô miasarma!

Porque, note bem, meu leitorado, enquanto todo povo q se preza constrói monumentos fálicos e verticais, como flechas apontando o céu, simbolizando pujança, poder, &c, alguns tronchos descerebrados acharam por bem construir no meio de São Paulo um símbolo fálico deitado ao contrário e... ¡¡indo pra trás!!



HAHAHAHAHAHAHA

É um símbolo desfálico, caído ali.

Mas se fosse só isso, não tinha problema. No entanto, o escultor encheu sua obra com mensagens subliminares de prepotência, embromação, obstrucionismo, malandragem, burrice, &c – essas coisas q, todo o mundo sabe, não fazem a glória dum povo...

Olha isto aqui:



¿Vc diria, leitor amigo, q esse indivíduo está imbuído na nobre tarefa de puxar a canoa das monções, desbravando com seu suor as matas brasileiras? Engana-se. Claro q ele NÃO está. Observe o colégua do outro lado:



Ao sair das mãos, as cordas fazem uma curva lânguida, caída, frouxa. Vc poderia dizer q ela acompanha a curvatura da canoa, claro. Mas...! olha mais de perto. Aqui está a continuação da corda da direita:



e aqui a da esquerda:



A corda ali toda desmilingüida só pode dizer uma coisa: ¡Os caras tão FINGINDO q trabalham!

Olha só este aqui:



ââârgh... ûûûrgh... O cara prendeu a corrente entre a perna e o casco, e finge q faz força... ûûûûrgh... ûûûûrgh... ¡Ufa ufa, q calor!

¡Ôô malandragem!

HAHAHAHAHAHAHA

Agora veja isto:



Tadinho, né? Desfaleceu-se de tanto trabalhar.

Mas ¿por q cargas d'água tão carregando o desfalecido? ¿Não seria muito mais ãã inteligente levá-lo dentro da canoa? Em vez disso, desperdiçam o muque de dois homens fortes q poderiam estar puxando a c... ãã... fingindo q puxam a canoa. Pô. ¡Incompetência, sô!

Agora considere este grupinho:



¿Q é q esses tão fazendo parados aí, pergunto? Uma festinha? ¿Com uma coisa ali q parece suspeitosamente com uma pizza?

(Tá bom, tá bom, já sei. Mas se logo atrás deles tem aquele cara q *supostamente* está puxando a canoa, ¿q é q estão os outros fazendo ali, obstruindo o caminho? ¿Qual é a idéia?)

Tem mais este grupo aqui:



Com os dois líderes à frente a cavalo, ¿não parece um bando de autômatos puxa-sacos? Diga a verdade. E ¿q é q estão fazendo? ¿Q são essas cordas em volta do pescoço? ¿Notou q um deles tem uma cabeça ínfima e um braço q parece uma perna? ¿E q os da frente estão fazendo um esforço desgraçado pra não parecerem mais altos q os líderes?

¡Ôô miasarma!

¿E os líderes? Olha bem pra esses líderes:



Dois cavaleiros viajando sentados, distanciados do resto, fazendo absolutamente NADA pra ajudar, mesmo com aquele monte de corda sobrando, e... ¡¡um deles ainda faz pose empinadinho olhando pra trás!!

!!!

Em lugar de usar a cachola e fazer os cavalos puxarem a canoa, temos q lá na outra ponta, onde seria a desglande, tem UM só gato-pingado, um nativo deste continente, um índio q não tem nada a ver com a história toda, o ÚNICO q parece estar tentando fazer alguma coisa de útil:



(É apenas por causa desse índio q o povo apelidou o MaB de "deixa-que-eu-empurro". Ou seja, todo o mundo instintivamente vê o q está acontecendo.)

Note também a corda toda, q está ali como estão todos os recursos desta terra: desusados, fazendo peso. E aí fica patente a pior idéia desse monumento: a própria presença da canoa, seu status ambíguo de raison d'être e tranqueira inútil, sua condição de peixe fora d'água na inglória terra firme. A canoa em terra torna este um monumento ao atrito, à lentidão, ao uso errado dos recursos, à deselegância.

E pra completar a piada, como a inscrição original no monumento já está ilegível, o CONDEPHAAT mandou colocar uma plaquinha mais modernosa ali perto...



...onde há um detalhe q o próprio monumento simboliza:



HAHAHAHAHAHAHAHAHA

.......

Mas ¿pra quê notar tudo isso, né?

A questão q abre as ilhargas do riso no doutor é a profunda vala entre o q o MaB pretende simbolizar (a conquista do Brasil, a colaboração entre as raças) e – por ser conceitualmente tão mal-ajambrado – aquilo q ele termina simbolizando no inconsciente de quem passa por ali todo dia, todo dia, vendo o líder q não ajuda, os autômatos puxa-sacos, aquela corda q não está tesa, o índio q trabalha sozinho, o doente estorvando o trabalho, a festinha no caminho do progresso. Seria ingênuo e hipoplausilético acreditar q a incompetência do artista não conspurca o inconsciente do povo.

(O Dr Plausível não é o único a ver essas coisas: por algum motivo o Brecheret teve q negociar durante 25 anos* com sucessivos governos pra conseguir terminar o MaB.)

A opinião do doutor é q o povo paulista não merece ser escarnecido e enganado permanentemente. Esse Monumento do Esforço Inútil, esse embaraço estadual perpetrado em granito, esse trambolho troncho e falso-moderno, tinha q ser dinamitado, transformado em cascalho e relegado à memória – onde nunca deveria ter entrado.

Mas ¿a expectativa de q isso aconteça? Zero.

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*Descontados os anos da 2ª guerra.

17 novembro 2007

Money makes the world go down

Nosso ebirridente doutor acaba de ver o recente filme de Michael Moore, Sicko, e tem isto a dizer:

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA
HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA
HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA

Vale a pena ver, nem q seja pelo magnífico timing.

Moore compara, dum lado, os amplamente satisfatórios sistemas de saúde do Canadá, Inglaterra, França e Cuba, responsabilidade de seus governos, e, do outro, o desastroso sistema de saúde euaense, regido pelo lucro das seguradoras (HMOs = health maintenance organizations, tipo planos de saúde). Este país (ie, o Brasil) – cujo sistema de saúde caminha incerto em cima do muro entre o modelo europeu e o euaense, pendendo perigosamente pra este último – faria bem em ver esse filme e meditar um tantinho.

Foi o q fez o doutor. Sicko não roça nem de leve no assunto "aborto". Mas isso não vai deter o doutor, vai?

Um aspecto, digamos, pouco visível nesse documentário é q nos quatro países extra-Euá visitados, duas coisas coincidem: (a) o aborto é legal e (b) o atendimento médico é eficiente e universalmente gratuito. Ou seja, se funcionar direitinho, nesses países (1) há uma limitação no número de nascimentos mas (2) toda vida q nasce é amparada e tem seu bem-estar assegurado pro máximo gozo.

Em contraste, nos Euá (a) o aborto é legal mas (b) o sistema de saúde extorsivo, ineficiente e corrupto deixa à míngua uma parcela enorme da população. Ou seja, se funcionar direitinho, nos Euá (1) há uma limitação no número de nascimentos mas (2) não se garante o bem-estar dos q nascem.

Já no Brasil, (a) o aborto é crime e (b) o sistema de saúde ineficiente e corrupto deixa à míngua uma parcela enorme da população. Ou seja, se funcionar direitinho, no Brasil (1) não há limitação no número de nascimentos E (2) não se garante o bem-estar dos q nascem.

Temos q:
Canadá, Inglaterra, França e Cuba: +a +b
Euá: +a –b
Brasil: –a –b

Nessa área, as leis brasileiras idealmente tendem a fazer do Brasil um país com população de alta rotatividade – gente nasce aos borbotões, tem lá sua vida ativa e, qdo dá defeito ou envelhece, definha rapidamente e bye-bye. É a política do "sai da frente, q atrás vem gente".

Ou seja, brasileiro nasceu pra trabalhar.

Qdo vc ouvir algum político, órgão do governo ou militante anti-aborto falar em "valorizar a vida", já sabe o q significa: aumentar o preço da vida útil. O retrato fiel do Brasil proposto são as empresas privadas de transporte público abarrotado de gente apinhada indo trabalhar, com um letreiro incongruente dizendo "Transporte: Um Direito Do Cidadão, Um Dever Do Estado".

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA

13 novembro 2007

O googlette

Admito q não é fácil entender alguns raciocínios do Dr Plausível, como alguém q dissesse "Ah, hoje de manhã vou comprar uns tomates, aproveitar e pagar umas contas, e depois à tarde vou entender um raciocínio do doutor."

Mas tá aumentando a freqüência com q nosso enigmático doutor dá de nariz contra uma porta.

Uma dessas portas é o pesquisador de Google, o googlette. O Google tem se tornado cada vez mais a fonte padrão de referência pra assuntos intra-internet, embora todo mundo reconheça q é dúbio, escorregadio e manipulado. A principal característica dele q é tida como contrapeso a esses obstáculos é q o Google tem toda a cara de ser... ãã... completo. Tem tanta coisa, né, ué? Só pode ser completo. O mundo inteiro tá no Google, não tá? Então.

Antes era: não passa na tv = não existe.

Hoje é: não está no Google = não existe.

HAHAHAHAHAHAHA

Mas o bom de ser discípulo do Dr Plausível é q ele ensina a prestar atenção na ESCALA das coisas. Há q lembrar o CDA:

mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima
mas nem por isso me achariam no Google

Ainda bem q não tinha Google à época do JLBorges. Imaginem o diálogo:

JLBorges: ¡Tou dizendo q vi com meus próprios olhos! Um verbete na enciclopédia sobre Uqbar, q falava do Orbis Tertius e...
Bioy Casares: Toma jeito, Zé Luís. Não tem nada no Google.

Mas o pior mesmo é o massacre contra o senso de humor promovido pela impressão de q tudo se sabe. Falando de Borges, se Funes não conseguia dormir porque não se esquecia de nada, o googlette não consegue rir porque pensa q pode saber tudo.

Êitcha.
________________

Adendo:

Pode-se eXtender a definição de 'googlette' pra 'pessoa-referente'. Pro googlette não existe nada q não esteja devidamente referenciado, seja num dicionário ou numa enciclopédia, seja na CARAS ou na NewScience. A pergunta recorrente do googlette é "¿onde vc viu isso?". O googlette não enxerga as palavras: só vê as informações. (Está claro, espero, q na interneta o googlette pode nem ser uma pessoa, mas uma persona.)

Pro googlette, as informações são tijolos claros e inquebráveis q nunca se entrecruzam pelo mero prazer de. O q se perde ao ser uma pessoa-referente é o senso de humor q vem da ambigüidade e sutileza da comunicação. Se vc faz uma piada óbvia com alguma informação claramente espúria e o ouvinte pede referência a uma otoridade, vc já sabe q o senso de humor e o simancol plausibilático caíram juntos do 8° andar durante uma briga feia.

Pior, vc já sabe q tá falando com alguém q fala muito em "cultura", do jeito peculiar com q o brasileiro usa essa palavra: "cultura" é coisa séria – uma espécie de nirvana q vc atinge depois de ler trocentos livros, ver trocentos filmes, ouvir trocentas sinfonias e turistar em trocentos países. Nunca ocorre ao googlette q o objetivo de ler, ver, ouvir e turistar é sempre, em última análise, rir.

11 novembro 2007

Tia Norma, professora de cálculo retardado

Há tanto achismo em quem prescreve a NoCu q parece torcedor brasileiro durante copa do mundo: só porque o cidadão joga umas peladas e reconhece os jogadores da seleção, já pensa q é técnico.

Gente q cultiva o raciocínio e idealiza a língua geralmente acha q a NoCu e o raciocínio andam juntos, e às vezes até fazem analogia com a matemática.

HAHAHAHAHAHAHA

Coisa mais despistada, sô. Junta um raciocínio simplório a um conhecimento vago, e é nisso q dá. Pra explicar a complexidade da coisa, nosso encomioso doutor se sente às vezes como se falasse de flores e abelhas pra explicar às crianças o instinto da trepada e sua influência na história das civilizações. Mas q seja, então:

A língua é um produto orgânico, e os sistemas orgânicos são notórios por sua exuberância, variabilidade e interdependência. Tem desde mamífero q bota ovo a peixe q voa, passando por planta carnívora e pássaro sem asa.

A "norma" "culta" – com a imposição arbitrária explícita em 'norma' e a ofensa arrogante implícita em 'culta' – não é a língua. É um pseudo-dialeto, fruto duma padronização simplista e simplória de apenas uma pequena parcela dos fenômenos da língua. Dada a exuberância, variabilidade e interdependência das centenas de dialetos do português, é ridículo, ilusório e autofílico postular q a distribuição de inteligência e racionalidade na população brasileira coincide com a distribuição de conhecimento da NoCu.

Anotem aí: raciocínio e inteligência nada têm a ver com fala padronizada, decoreba de ortografia e recursos de estilo. Sorry.

Se tivesse, não existiria (e notem o produto orgânico) a síndrome de Beuren-Williams, q é um tipo de retardamento mental aliado à loquacidade e correção gramatical. Nem haveria os vários outros tipos de retardamento q contêm em suas síndromes o uso de gramática rebuscada ou de palavras incomuns ou de encadeamentos perfeitamente sintáticos e lógicos porém absolutamente patéticos. No outro extremo, se o raciocínio tivesse a ver com a NoCu, não existiriam tantos gênios matemáticos incapazes de abrir a boca sem empapuçar a própria sintática (tipo "Essa fórmula aqui não dei maior importância nem menos q pràquela.").

A NoCu é apenas mais um poço enganoso de idealismo q serve de armadilha pros tontos incautos: democracia, justiça social e pimba! norma culta. A exuberância, variabilidade e interdependência das ideologias, ideais e dialetos é q é a regra.

O lema "Ordem e Progresso" é o maior desserviço q já se fez a este país.

06 novembro 2007

Falha humana: culpismo

O pesadelo do culpismo são acontecimentos como o 11 de setembro. A culpa por tanta destruição estava tão claramente estampada na testa dos seqüestradores suicidas, q o governo euaense viu-se imobilizado por um anti-clímax angustiante: eles não podiam nem se dedicar ao instinto de procurar os culpados, nem ao de puni-los, já q todos tinham virado churrasquinho. ¿Q fazer, então? ¿Q faz um ser humano normal num impasse? Claro, tem um ataque de nervos e quebra alguma coisa. "¿Tá pensando o quê, louça feia? Nunca gostei de vc. ¿Pensa q vai sair dessa impune?"

Os euaenses então saíram pelo mundo quebrando a louça feia do Afeganistão e do Iraque. É o q dá ser romântico herdeiro de Rousseau.

Ao contrário do q Rousseau penseau, o Contrato Social não existe pra facilitar a colaboração entre indivíduos. Existe meramente pra q as gentes se dediquem a seu instinto social favorito: botar culpa em alguém. A sociedade só existe pra aumentar o número de coisas q podem dar errado – e portanto o volume de culpa q pode ser alocado. Há tanta culpa por alocar q já não há limites. A lógica é assim: se o aquecimento global pode não ser um fenômeno natural, então não é: alguém TEM q levar a culpa. Se ainda ninguém leva a culpa por terremotos é porque ninguém ainda descobriu como um terremoto pode ser causado por uma falha humana.

Cai um avião matando 200 pessoas, e ¿de quem é a culpa?, pergunta-se o populacho.
Cai um viãozinho matanto 8, e... ¿de quem é a culpa? pergunta-se a plebe rude.

Tem gente q já vai botando a culpa no piloto, claro. E mais claro ainda, tem gente q já vai denunciando quem faz isso:

"Iiiihh, meu Deus. Já vai ter quem bote a culpa no piloto. Essa gente não presta mesmo, hem?"

Mas, ué? Se acidente de carro quase sempre é culpa dum motorista, ¿por q é q acidente de avião não pode ser do piloto?

Também tem o oposto, aqueles q decoraram a frase "ainda é cedo pra se falar em falha humana." Mas ¿q outra falha existe, ô júnior? Um acidente com artefatos humanos só ocorre porque mais de uma pessoa se distraiu num momento crítico – seja na idealização ou na construção; seja na manutenção ou na operação. Quer dizer, na realidade, se existe culpa – a responsabilidade por desencadear um evento desagradável –, ela está longe de ser individualizada: pode-se culpar igualmente o piloto como o inventor da aviação.

Morreram 200 pessoas em Congonhas porque Congonhas existe, ora pois não?

É claro q, no estado de direito, a atribuição de culpa foi promovida de instinto social a meramente uma ferramenta legal pra descolar uns trocados. Desindividualizar a culpa seria a pior estratégia dum advogado. A neurose principal da sociedade moderna é q tudo tem q funcionar perfeitamente. Faça alguma coisa mais natural – como tropeçar, cochilar, distrair-se – e ai de vc. Uma vez assassino, sempre assassino.

Mas deixa pra lá. Só estou tagarelando enquanto espero nosso enaltecível doutor voltar de viagem.

17 setembro 2007

sementes estranhas

Nosso epifânico doutor – q, como resenhista literário dos Cadernos de Plausibilática, tem uma longa bibliografia crítica oral – publicou hoje uma resenha na Copa de Literatura Brasileira, ditada impromptu via telefone desde Basra, onde ora ministra um curso de Plausobélica Mirim a um grupo de moscas.

14 setembro 2007

Origens lingüísticas do atraso brasileiro, parte 3

Após ler o adendo a este artigo, o Alex Castro me aperguntou a següinte coisa:
«mas agora eu queria te ver explicando pq a lingua portuguesa nao produz porshes... o que ela tem intrinsicamente de diferente, digamos, do ingles ou do alemao que a impede de fazer isso ou ou aquilo... alias, isso ou aquilo o que?»
Levei a pertinente indagation a nosso embasbacante doutor, q me arrespondeu numa conversa de quase 14 horas, ao mesmo tempo chatíssima e interessantíssima. (¡Vai dar exemplo assim lá em Torquemada!) Posso dizer, sem medo de passar ridículo, q não me alembro nem de 10% do q ele disse, embora eu tenha, por assim dizer, “pegado a idéia geral” – essa categoria de pensamento q é o ganha-pão de professor de faculdade.

Tãovamolá.

a tese
A civilização – entendida como o processo complexificante de civilizar – depende da acumulação de instruções e obediência a elas: qto mais complexa e civilizada é uma cultura, tanto mais instruções se descobrirá permeando toda sua estrutura. Uma instrução é qqer declaração q direcione uma ação: leis, decretos, regras, manuais, avisos, comandos, &c.

Uma instrução sempre almeja a explicitude. Pra ser explícita, uma instrução precisa ser seca, direta e clara. Sem instruções assim, é impossível juntar 10 mil pessoas numa organização amparada por uma comunidade de 100 mil, inserida numa cidade de 1 milhão, suprida por um país de 10 milhões, e esperar q aquelas 10 mil construam Porsches.

A tese do doutor é simples. O português e o espanhol, com suas rocoquices e frescuras, são línguas em q a explicitude dá trabalho demais. O brasilês é pior ainda. Já o inglês, o alemão e o japonês são línguas explícitas: secas, diretas, claras. A explicitude das instruções vem duma característica presente mais claramente no japonês: o ideograma. O ideograma é um símbolo imutável: vc bate o olho e já vê o q é, sem referência à gramática circundante. Em inglês e japonês, essa imutabilidade está presente também na língua falada: as palavras têm poucas variantes gramaticais (em inglês, por exemplo, adjetivos, preposições, artigos e advérbios são imutáveis; verbos têm no máximo 5 formas, exceto o be q tem 8; substantivos só mudam em número). Assim, as instruções podem ser dadas como seqüências de ideogramas.

Além disso, essas línguas mantêm a mesma ortografia há séculos, auxiliando a função ideogramática de seus vocábulos.

exemplo inglês
Veja este exemplo, tirado do manual de treinamento de novos funcionários duma firmeca inglesa:
Let trainee read task instructions.
Allow trainee time to complete task.
Report task completion to your supervisor.
Ou seja, com uma série seca de palavras-ideogramas, a instrução diz q o treinador deve deixar o treinando ler as instruções duma tarefa, dar um tempo pra q ele a realize e, qdo este terminar, avisar o supervisor dele (do treinador) q a tarefa foi terminada.

Tente escrever essas instruções em português. Pior: tente em brasilês. Vc vai ter q incluir preposições, artigos, concordâncias; vai ter q acochambrar as traduções de 'allow time', 'report' e 'completion', e pra arrematar, vai ter q dar um jeito de esclarecer q é o supervisor do treinador e não o do treinando q deve ser avisado.

Essas coisas ocupam um espaço precioso na cabeça do portuguesante e, pior, um tempo precioso em sua vida.

A seguir, dois exemplos de instruções originalmente idealizadas e redigidas em português. Vc vai querer chiar q esses exemplos todo o mundo vê q foram mal redigidos, &c. Mas nem se incomode. A questão q o doutor quer esclarecer não tem a ver diretamente com a redação.

exemplo brasilês 1
Uma lei promulgada pelo governo do estado de SPaulo determina q o seguinte aviso deve ser afixado em toda porta de elevador no estado.
ANTES DE ENTRAR NO ELEVADOR, VERIFIQUE SE O MESMO ENCONTRA-SE PARADO NESTE ANDAR.
Ok. Essa é velha. Largamente criticado e escarnecido. Mas atente pros detalhes.

“ANTES DE ENTRAR NO ELEVADOR ... NESTE ANDAR”
• Ô, Pedro Bó, só é possível entrar no elevador se ele está parado neste andar. Se entro no elevador, ele não pode estar na quarta dimensão dum buraco negro. Só por essa, o aviso já parece saído de alguém de mente confusa.

“...VERIFIQUE SE...”
• Ou seja, não precisa CONFIRMAR QUE ele está no andar. Basta verificar SE ele está ali.
– Ok, já abri a porta e verifiquei. Ele NÃO está. ¿Posso atravessar a porta agora?

“...O MESMO...”
• Questão gramatical amplamente discutida na internet, orkut, &c, onde se tende a sugerir “...verifique se ELE se encontra...”. (Note o seguinte, leitor: grande bosta. Essa é a parte do aviso semanticamente MENOS absurda, e ¿o q acontece? Milhões de portuguesantes reclamam dela pq trata-se duma questão formal. Êitcha.)

“...ENCONTRA-SE PARADO...”
• ¿Como assim, “encontra-se” parado? ¿Pq, se dissesse “está parado”, daria a impressão de “está quebrado”?
– Olha lá aquele cara na esquina. ¿Ele encontra-se parado ao lado do poste?
– Olha lá o sapato no chão. ¿Ele encontra-se jogado embaixo da cama?
– Olha lá meu carro. ¿Ele encontra-se estacionado em frente ao banco?

“...NESTE ANDAR.”
• Não, Pedro Bó, estou neste andar pra pegar o elevador no andar de cima.

Parafraseando a mensagem lógica desse aviso, o q ele de fato DIZ é algo assim:
Antes de entrar no elevador, veja se é possível NÃO entrar. Se for possível entrar, entre. Se NÃO for possível entrar, entre assim mesmo.
HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA

A barbaridade do aviso existente não quer dizer q a idéia central dele não possa ser facilmente expressa em português. Veja:
CUIDADO! NÃO ATRAVESSE ESTA PORTA SE O ELEVADOR NÃO ESTIVER DO OUTRO LADO.
Simples, não?

exemplo brasilês 2
A rocoquice do português confunde o redator. Ele acha q a instrução q redige é tão pedante qto a gramática q quer usar. Observe esta protuberância, excretada por não menos q o Ministério da Saúde (via ANVISA):
AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO.
uma frase q igualmente poderia ser interpretada como “quando os sintomas persistirem, pois certamente persistirão, é provável q o único médico do mundo seja consultado por alguém.”

QUA QUA QUA QUA QUA QUA

¿Por que não faz assim, ó:
“SE OS SINTOMAS PERSISTIREM, CONSULTE UM MÉDICO.” ?
É tão fácil.

prestenção agora
Mas a questão q o Dr Plausível enfatiza é COMPLETAMENTE OUTRA. O problema do português não é q ele tem maus redatores q escrevem coisas ilógicas e pedantes. O problema [¡prestenção!] é q o leitor ENTENDE o q o redator quis dizer. As rocoquices confundem tanto a cabeça do redator qto a do leitor.

Vc pode ter achado q nosso exosférico doutor entrou em contradição, pois ¿como é q diz q o leitor “entende”, se as rocoquices o “confundem”? Veja bem: o leitor entende o q o redator quis dizer, e não outra coisa, apesar de q é a outra coisa q está efetivamente sendo dita.

Pois é. Citando o artigo q começou esta série: “Não pode ter muito a dizer uma língua em q algo de significado contraditório pareça fazer sentido porque, no contexto, só pode ter outro significado.” O significado entendido é sempre aquele q mais costumeiramente se adapta ao contexto. Esse é um problema gravíssimo pra uma cultura numa era tecnológica: ele condena o brasilês a ficar preso a lugares comuns, a repetir idéias comuns, a sempre voltar ao eixo caseiro e banal das percepções, a jamais prover a base pra pensamentos revolucionários, a sempre consumir idéias importadas de línguas q facilitam a criação de idéias q estarão cada vez mais fora do meramente intuitivo.

E então, de todas as coisas hilariantes q poderiam acontecer a esta língua provinda dos confins da Europa – ali, antes de acabar o mundo conhecido – aparecem, como lagostas entediadas emergindo do mar de sargaço a q estão relegados, os reformadores da ortografia.

Exatamente o q o português precisava. 250 milhões de analfabetos instantâneos.

09 setembro 2007

Sobre ler e crer

O Dr Plausível já disse q "manter-se bem-informado é o jeito trabalhoso de ser neurótico". Mas o mais engraçado é jornal alardear a própria credibilidade. ¿É pra acreditar? 'Credibilidade' parece palavra inventada pra não dizer nada.

E fala a verdade, caro leitor. Qdo abre um jornal, ¿vc espera "acreditar" no q lê? tipo qdo vai ver uma comédia esperando gargalhar? ¿Acaso alguém alardeia a 'gargalhabilidade' duma comédia?

Nosso emoldurado doutor não acredita numa palavra do q lê nos jornais. Não é pra "acreditar" q ele abre um jornal; nem é pra se informar. E ele tem sérias dúvidas de q, mesmo q afirmem o contrário, os jornaleitores sujem os dedos em busca de informações críveis. O q eles querem é debater opiniões interminavelmente.

O jornal é um Big Brother da época em q não havia televisão, e os jornaleitores são viciados em xeretar a vida alheia, convencendo-se de q vai fazer alguma diferença pessoal saber ou não saber o q acontece no congresso, no estádio ou na delegacia. Na verdade, os xeretas e sua xeretagem é q fazem diferença na vida dos xeretados, e não o contrário. Se existe algum valor na veracidade dum jornal, é um valor totalmente interesseiro: qto mais verdadeira a informação, tanto menos provável q alguém seja processado por publicá-la. Campanha com o tema "credibilidade" soa como gambito preventivo contra possíveis disputas judiciárias.

Agora, o grau de veracidade das informações não faz a menor diferença pro jornaleitor, q só lê jornal pra achar uma confirmação a favor ou um debate contra suas opinões. A vida dum leitor médio é tão ínfima, q pelo menos ISSO, né?

Já o Dr Plausível só abre jornal por três coisas: quadrinhos brasileiros, cruzadas e sudoku. Tem tempo pra ser "bem-informado" não.

03 setembro 2007

Copa e cozinha

O Dr Plausível é um dos jurados da I Copa de Literatura Brasileira, o tipo de coisa prà qual a internet existe.

Nosso emulsificante doutor não costuma se misturar com literatos – por falta de tempo, diga-se. Mas foi impossível resistir ao cachê astronômico e à possibilidade de exercer o direito à crítica num país assolado pelo dever divulgatório.

31 agosto 2007

"uai, ¿ovo não tem pelo?"

Nosso emulsificante doutor viu o debate promovido pelo Estadão sobre a blogosfera. Chama-se "Responsabilidade e Conteúdo Digital."

hahahaha

HAHAHAHAHAHA

HAHAHAHAHAHAHAHA

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA

Raras vezes ouviu tanta besteira junta.

Debatedor é um tipo de fazendeiro mineiro, não é? No fim do dia, senta na sala com a família e joga conversa fora até a hora da caminha.

(Ah... Tá bem. De vez em quando alguém fala algumas palavras sensatas.)

29 agosto 2007

Houaiss x Oxford

Um caro leitor deste blogue pediu a nosso ecoante doutor q desse uma resposta final e definitiva à pergunta q não quer calar no peito de tantos amantes sopeados da língua portuguesa:

Afinal, ¿o português tem mais palavras q o inglês, ou o inglês tem mais palavras q o português?

Uma empreitada dessas requer uma certa pachorra. O doutor —q tem uma edição eletrônica do Houaiss— se dispôs a contar o número de verbetes total. Não é tão difícil. O Houaiss traz um buscador onde vc pode chamar todos os verbetes q, por exemplo, começam com P e terminam com A (ou seja, p*a). O resultado mostra também o número desses verbetes —q, no caso, são 3.711. Isso não quer dizer q todos esses 3.711 verbetes sejam palavras. Temos, por exemplo:

PA: sigla do estado do Pará
Pa: símbolo de protactínio

Também há verbetes q começam ou terminam com hífen (os sufixos, prefixos e elementos de composição), além de verbetes q terminam em ponto final (as siglas como F.O.B. e abreviaturas como loc. cit.).

Pois então. Fazendo a soma de todos os verbetes q começam com A, Á, Â, B, C ... .Z e terminam com A, Á, Ã, B, C ... Z, mais todos os prefixos &c, mais todas as siglas &c, o número total de verbetes do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa é...

186.252

Hm. Tirando os prefixos &c, as siglas, os símbolos e as abreviaturas, o número total de palavras ou locuções é

175.705

Hm.

O prefácio do Houaiss fala em 228.500 "unidades léxicas". A discrepância talvez se explique pelo fato de q uma mesma palavra pode ter mais de um significado. Se for esse o caso, o prefácio deveria ter falado em "unidades semânticas" e não "léxicas". Houaiss indeed.

O prefácio tbm indica q no Houaiss também tão incluídas muitas palavras usadas exclusivamente em Portugal, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola e Moçambique – por exemplo, as portuguesíssimas palavras djila, macuaiela, lunyaneka, e ocaviiúla.

Hm.

Mas como a pergunta q não quer calar é sobre o número de palavras e não de unidades semânticas, fiquemos com 175 mil.

Dessas, muitas são apenas variantes. Por exemplo, dentre os verbetes "p*a" temos, por exemplo:

pacata = pacatez
pachocha = pachoucho
páfia = empáfia
pagadoiro = pagadouro &c &c &c

Mas já q o Houaiss deve tbm ter "se esquecido" de muitas palavras (tipo 'bicicletaria', q não consta), digamos q o número total de palavras da língua portuguesa teja por volta de 175 mil mesmo.

Hm. Resta mais um "hm".

Agora vamos ao inglês.

O Oxford é um dicionário bastante conservador. Sua edição atual tem 20 volumes.

http://en.wikipedia.org/wiki/Oxford_English_Dictionary
http://www.oed.com/public/about

A maior parte do espaço desses 20 volumes é constituída de exemplos. O Oxford pega um pouco pesado nos exemplos (todos tirados de fontes externas), e esse é um dos motivos por quê digo q ele é conservador. Mas digamos q, tirando todos os exemplos, sobrem 5 volumes.

Hm.

A edição de 1989 define e/ou ilustra 615.100 palavras e locuções. Agora observe um fato revelador. O Oxford tem um conceito q eles chamam de "main entry" (verbete principal). Essas 615 mil palavras aparecem dentro de 301 mil main entries, assim como as 228 mil "unidades léxicas" do Houiass aparecem em suas 175 mil palavras.

Só que...

O Houaiss é feito nos moldes dos dicionários brasileiros: talvez pra inflar o tamanho (e certamente fazendo pouco caso da inteligência do usuário), cada palavra tem um verbete independente, inclusive todas as derivadas (exceto advérbios formados com -mente). Por exemplo, cada uma das palavras abaixo tem um verbete independente no Houaiss:

destrucionismo, destrucionista, destruição, destruído, destruidor, destruir, destruível, destrutibilidade, destrutível, destrutividade, destrutivismo, destrutivista, destrutivo, destrutor

Já o Oxford, utiliza a inteligência do usuário e coloca muitas dessas palavras dentro do mesmo main entry, como derivadas.

Outro exemplo. No Houaiss, temos estes 18 verbetes independentes:

fenil, fenila, fenilalanina, fenilalanínico, fenilamina, fenilanina, fenilbutazona, fenilcetonuria, fenilcetonúria, fenilcetonúrico, fenilefrina, fenilênico, fenileno, fenilenodiamina, fenilidrazina, fenil(o)-, fenilo, fenilpirúvico

HAHAHAHAHAHAHA

Já no Oxford, temos o verbete único phenyl, no qual tão incluídas as correspondentes inglesas de todas as palavras acima, mais uma caralhada de outras do mesmo grupo químico. Veja vc mesmo:

http://fds.oup.com/www.oup.co.uk/pdf/0-19-861186-2.pdf

Então é MUITO diferente o Houaiss ter 175 mil palavras e o Oxford ter 301 mil main entries, não é? O q o Houaiss faz é um tipo de ilusionismo.

Caso reste alguma dúvida sobre qual das duas línguas tem mais palavras, dê uma olhada nisto:

http://www.urbandictionary.com/

um dicionário colaborativo q, claro, não tem critérios tão rigorosos como os do Oxford. Muitos verbetes são gírias localíssimas, e muitos são apenas trocadilhos. Mas se algum ufanéscio, depois de dar uma olhada no Urban Dictionary, ainda falar da "riqueza" da língua portuguesa, vc pode levá-lo amarrado à filial mais próxima da Clínica Dr Plausível.

O português tem inúmeras qualidades. O número de palavras não é uma delas.
________________

Adendo:

No Brasil (mais: em toda a América Ibérica) todos reclamam do atraso, da ignorância, dos erros administrativos, da corrupção, da pobreza, da lentidão nos processos, da incompetência na execução, do desprimor nos resultados. Todo reclamante tá basicamente invocado com um enigma: "Entende-se o atraso na África, no Paquistão, até na China. Mas ¿por quê nós —logo nós, descendentes diretos da Europa— estamos assim?"

Todas aquelas moléstias têm múltiplas causas. Mas pro Dr Plausível, uma causa é comum a todas elas —a ferramenta-mor da sociedade: a língua.

Dizem —com razão— q o mau artesão reclama das ferramentas q tem; mas não dá pra construir um Porsche com as ferramentas e os processos q se usa pra construir um Corsa.

A América Latina é uma fábrica de Corsas q recebeu o encargo de produzir Porsches; claro, as máquinas não tão produzindo com a qualidade necessária. Numa fábrica, qdo uma máquina não funciona com precisão, pode ser pq não tá bem calibrada. Quem determina isso é o inspetor de qualidade. Chama-se então o ferramenteiro pra calibrar a máquina. Este usa instrumentos de medição, q tbm devem tar calibrados. Quem determina se eles tão calibrados é o metrologista.

Nosso excomungável doutor só (!) tá dizendo q o metrologista, o ferramenteiro, o inspetor de qualidade e o operador da máquina latino-americana atribuem a baixíssima qualidade de seus Porsches ao salário, às condições de trabalho, à incompetência da chefia, às dificuldades do projeto &c, qdo na verdade o problema é a máquina em si. Seria preciso trocar de máquina, assim como o Brasil precisaria trocar de língua —pois a língua portuguesa, left to its own devices e do jeito q é proposta pelo gramático-metrologista, jamais vai produzir o Porsche da sociedade justa, culta, complexa, competente, asseada e otimista q seus falantes almejam.

Ou então optar pelo caminho mais honrado porém mais difícil de mandar o projeto-Porsche às favas de onde veio e procurar descobrir pra quê serve afinal a língua portuguesa, qual universo cultural ela pode engendrar, qual organização social, ideológica e pragmática ela tá univocamente posicionada pra criar, desenvolver e exportar.

E contra isso tudo está a poderosa, estúpida e aviltante pressão ideológica e política exercida pelos gramáticos e lexicógrafos da NoCu.

¿A esperança do Dr Plausível? Zero.

24 agosto 2007

Engulho de ser brasileiro

That which we call a rose
By any other name would smell as sweet.

W Shakespeare


Uma ironia de ser latino-americano é q, por mais desenvolvidas q venham à se tornar estas plagas num futuro hipotético, parece q o amor-próprio, a valorização da cultura e da personalidade latino-americanas jamais se associarão ä tecnologia e à uma visão progressista. Que pena. Latino-americano sempre se sentirá consumidor ao invés de produtor de tecnologia.

¿Tá fazendo cara feia, leitor?

Pois então, olha aqui algumas das mais conceituadas marcas do mundo:

Bic, Boeing, Chevrolet, Citroën, Colgate, Ericsson, Ferrari, Firestone, Ford, Gerdau, Hewlett-Packard, Honda, Honeywell, Johnson's, Lamborghini, Lockheed, Mercedes-Benz, Olivetti, Opel, Peugeot, Philips, Pirelli, Porsche, Renault, Rolls-Royce, Siemens, Suzuki, Yamaha*

¿Notou uma coisa? São todos sobrenomes de seus fundadores.

Muito brasileiro, muito latino-americano, se diz orgulhoso de seu país ou amante de sua terra e sua língua. É natural. Mas ¿será plausível? A próxima vez q vc ouvir alguém dizer algo assim, deixa passar uns dois dias, aí leva o indivíduo prum cantinho calmo e pergunta:

¿Vc compraria um carro Gonçalves?

Apresentamos o novo Gonçalves Crioulo 300L, com injeção eletrônica.

¿Viajaria num avião Coutinho?

Conforto e segurança. Tecnologia e beleza. Coutinho 737.

¿Teria um televisor López?

Televisor López tela plana. Sua melhor imagem.

¿Usaria o creme dental Freitas?

Hálito puro, sorriso Freitas.

Ao ouvir essas sugestões na pesquisa feita pelo Instituto de Plausibilática, 97% dos respondentes deram risada, sugeriram outros produtos e eslôgãs ("Almeida, a marca do homem." "Venha para o mundo de Ipatinga." &c), e nem notaram o desserviço q prestaram ao próprio orgulho.

Seria de se perguntar se um Moreira, um Rodrigues ou um Sampaio alguma vez visualizou, com orgulho e total seriedade, um carro, um avião ou um televisor com seu nome. E caso não (o q é mais provável), ¿por quê não? ¿Por quê é q tecnologia com nome português ou espanhol parece piada?

Outra ironia é q um sobrenome é o nome duma família, e portanto duma linha genética. Toda vez q um Silva ou um Sánchez compra um creme dental Colgate pra fazer bonito com uma Costa ou uma Ramirez e com ela gerar filhinhos, ele tá automaticamente promovendo ao mesmo tempo o nome duma linha genética totalmente outra. Cada dente branco dele é uma chance à mais prum cromossomo Colgate.

Quando vem aqui um grupo de executivos, digamos, alemães da ThyssenKrupp (dois sobrenomes) pra checar si os nativos tão fazendo tudo direitinho [e vira aquela polvorosa na empresa: secretárias, engenheiros e executivos brasileiros suam frio pra falar alemão e, nas reuniões, fazem papel de colegial recitando tabuada na frente da classe], os visitantes –mesmo q não se chamem Thyssen ou Krupp– tão o tempo todo conscientes de q tão promovendo e defendendo os interesses duma firma alemã, ou seja, dum sobrenome alemão, ou seja, duma linha genética alemã com a qual compartilham ou os olhos azuis ou a pele branca ou o cabelo amarelo ou somente a língua.

E à vc, leitor amigo –q se lembra, por exemplo, dos Souza Cruz e dos Camargo Corrêa, &c e q, apesar de entender lá no íntimo a piada com o Gonçalves quatro-portas e o fio dental Freitas, atribue a graça ä sonoridade, ä estranheza, &c–, lembro q é bem diferente a reação de, digamos, um zeuaense ä idéia dum DVD de marca Smith e a dum brasileiro ä de um de marca Simões. O zeuaense ri da incompatibilidade mercadológica. O brasileiro ri da improbabilidade tecnológica.

¿Por quê?
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*Como já vieram me dizer via email q nem todos aqueles nomes de empresas são sobrenomes, aqui vai a lista dos fundadores, separados por país e data de fundação das empresas:
Alemanha: 1811 Friedrich Krupp, 1847 Werner von Siemens, 1860 Friedrich Thyssen, 1863 Adam Opel, 1871 Karl Benz, 1931 Ferdinand Porsche; Brasil: 1901 Johann Kasper Gerdau; Euá: 1806 William Colgate, 1886 Robert & James Johnson, 1900 Harvey Firestone, 1903 Henry Ford, 1906 Mark Honeywell, 1911 Louis Chevrolet, 1912 Alan & Malcolm Loughead (Lockheed), 1916 William Boeing, 1939 William Hewlett & David Packard; França: 1882 Armand Peugeot, 1899 Louis & Marcel Renault, 1919 André Citroën, 1945 Marcel Bich (Bic); Holanda: 1891 Gerard Philips; Inglaterra: 1906 Charles Rolls & Frederick Royce; Itália: 1872 Giovanni Pirelli, 1908 Camillo Olivetti, 1929 Enzo Ferrari, 1963 Ferruccio Lamborghini; Japão: 1897 Torakusu Yamaha, 1909 Michio Suzuki, 1948 Sichiro Honda; Suécia: 1875 Lars Ericsson.

22 agosto 2007

O estado do direito

Antes de pensar em se propor a ter a intenção de falar alguma besteira pré-imputante contendo palavras tais como 'mensalão' ou 'petista', leia isto.

(E antes q alguém já saia correndo denunciar nosso equipado doutor à Liga das Senhoras Cansadas, lembro q [1] o linque fala apenas do processo penal: nada a ver especificamente com mensalão ou não mensalão; [2] o Brasil é um país vastíssimo com uma capital artificialmente instalada no meio do nada; [3] o Dr Plausível é totalmente apartidário: absolutamente todos os políticos deveriam estar na cadeia, junto com quase toda a população; [4] a justiça não é cega: só está vendada; [5] ainda bem q pelo menos está vendada: se não, não haveria hipocrisia.)