10 junho 2008

Alvos, encaixes e válvulas (2)

2. ENCAIXES



Muitas gargalhadas de nosso entretente doutor se devem a ele ser darwinista; aprendeu a gargalhar com seu mentor intelectual mas deve muitos de seus gargalhos ao barbudo com nariz de bolinha.

Acho q de todas as tchurmas com potencial gargalhável, os criacionistas tão 6 mil anos à frente. Ô tchurma doida, sô. E é tão irônico. Pq o criacionismo é a prova cabal de q o ser humano é apenas um macaco melhorado. Veja qqer documentário com chimpanzés ou gorilas, e logo salta aos olhos nem tanto a semelhança física, mas a semelhança emocional. Chimpanzé gargalha, fica triste, manipula, faz política, brinca, mente, acaricia, trai. Não há como fazer um chimpanzé ficar sentado quieto qdo ele tem CERTEZA duma coisa. Ô bicho insistente.

Gente criacionista seqüestra o estilo científico, e aí vem com esse papo de q a vida não pode ter surgido espontaneamente pq a probalidade de organismos complexos blablablá é infinitamente blablablablá e bloblobló. Acho q todo o leitorado aqui sabe do q tou falando, sim? Não preciso destrinchar a coisa toda, não? Então.

Esse pessoal tem algum problema pra entender probabilidades. É difícil fazer um criacionista sentar quieto e ouvir um explicação racional; mas se vc um dia tiver a chance de explicar pralgum Duro Defensor Deísta do Desejo de Dogma como entender as probabilidades no evolucionismo, pode começar demonstrando a possibilidade de a vida ter surgido espontaneamente – o q, aliás não tem nada a ver com evolucionismo; tá aqui apenas pra demonstrar uma das falácias criacionistas:

A presença de DNA servindo a mesma função em TODAS as formas vivas existentes no planeta Terra é um forte indício de q a vida se originou apenas uma vez. Mas se tudo descende de um único evento, a questão é ¿qual foi esse evento? Sei lá, mas só pode ter sido um evento física e quimicamente possível, pois a vida em si não é mais do q física e quimicamente possível. Um evento só é possível se os objetos envolvidos agem segundo suas propriedades. Não é possível fazer um bife de gelatina nem um suflê de lava. O q quer q tenha originado a vida na Terra obedeceu às leis da física e continua obedecendo.

Uma das propriedades das moléculas é q elas se encaixam umas nas outras formando (talvez) infinitos compostos possíveis. (A frase seguinte pode parecer uma tautologia, mas é algo q precisa ser dito.) Pra q a vida surgisse, não foi preciso mais do q as condições necessárias pra q surja a vida. Uma molécula se encaixa em outra, q se encaixa em outra e, papati-patatá, cá tamos nós.

Criacionista então insiste q não houve tempo hábil. Caso teu criacionista seja daqueles q têm CERTEZA de q o universo não tem mais do q 6 mil anos, dê-lhe uma banana e tire uma foto ao lado dele. Caso ele seja mais maleável e ainda assim insista q não houve tempo hábil pq a probalidade de organismos complexos blablablé é infinitamente blablablú, vc pode lhe mostrar o q é "probabilidade cumulativa".

Supunhetemos q vc tem dez dados e q, se vc os joga numa fileira e obtém a seqüência 6354136224, vc cria o primeiro ser vivo em toda a história do universo. Um criacionista diria q a chance de isso acontecer é 1:610, ou seja, q vc precisará, em média, jogar os dados 60.466.176 vezes – mais de 60 milhões de vezes – pra chegar àquela seqüência de números.

Mas, claro, não é assim q acontece.

Primeiro, se a vida apareceu neste planeta – q é apenas UM em TRILHÕES de planetas possíveis –, então o planeta em q vc tá É o planeta q ganhou na loteria. Gente ganha na loteria toda semana e (por favor, não desmaie) a pessoa q ganha é sempre **justamente** aquela q apostou o número q dá. Estranho, não?

Segundo, na natureza as coisas acontecem gradualmente e cumulativamente. Ou seja, pra simular o q acontece na natureza e conseguir a seqüência toda de dez números, basta segurar cada número assim q vc chegue nele. Vc joga os dez dados; qdo o primeiro da fileira der um 6, vc segura; joga os outros nove; qdo o segundo da fileira der um 3, vc segura; e assim por diante até conseguir os dez números na seqüência correta. Como a probabilidade de conseguir cada número é 1:6, a probabilidade total é 6x10=60. Cumulativamente, vc precisaria em média jogar os dados *apenas* 60 vezes pra conseguir aquela seqüência de números.

Assim, até eu. Vc consegue em 60 jogadas aquilo q o criacionista achou q precisaria de 60 milhões.

Terceiro (e este é um fator tão básico q é difícil não gargalhar ao ver um criacionista revirando a idéia no cérebro pra ver se se ofende ou não), por mais q a vaidade dos seres vivos diga o contrário, a matéria não é uma propriedade da vida: é a vida q é uma propriedade da matéria. Ou seja, as moléculas se encaixam umas nas outras pq essa é uma propriedade das moléculas, e os encaixes q geraram a vida aconteceram pq encaixou-se o q se encaixava e não encaixou-se o q não se encaixava. O DNA é apenas um polímero, "uma molécula morta, uma das moléculas mais não-reativas e inertes do mundo" (R Lewontin).

Resumindo, nem este é o único planeta do universo, nem a complexidade aparece de repente, nem a vida surge em ambientes onde não há moléculas q se encaixem umas nas outras.

Mas, claro, macaco burro não aprende.

________________

Adendo:

Na verdade, a probabilidade cumulativa de se chegar a uma certa seqüência de dez números jogando dados é maior do q 1:60; a probabilidade correta é aproximadamente 1:55*. Isso acontece pq se vc tá tacando os dez dados esperando o primeiro número, é possível q numa das tacadas consiga mais do q apenas o primeiro número; pode conseguir os dois primeiros (1:36) ou os três primeiros (1:216), &c. Essas probabilidades adicionais precisam ser computadas pois se vc consegue, por exemplo, os dois primeiros numa das tacadas, pode então pular as tacadas do segundo número e ir direto pràs tacadas do terceiro, e assim por diante.

*Esse é um resultado experimental. Ainda não consegui deduzir a fórmula.

09 junho 2008

Alvos, encaixes e válvulas (1)

1. ALVOS

Um dos passatempos prediletos de nosso eqüidoso doutor é reducionar a dabissurda.

Imagine o seguinte cataclisma. No espaço de um só dia, caem 5 meteoritos sobre a Terra, sem aviso. Um cai no meio de Benares, a cidade sagrada do hinduísmo; outro cai no meio de Jerusalém, a cidade sagrada do judaísmo (ou não só); outro no de Roma, do cristianismo; outro no de Meca, do islamismo; o quinto cai nalguma outra cidade sagrada – sei lá qual mais há; vc escolhe.

Nesse dia, claro, milhões de pessoas morrem instantaneamente e os símbolos mais sagrados de cada religião viram fumaça. Os outros 6,5 bilhões de pessoas no mundo entram, claro, em estado de choque. Grande parte da civilização entra em colapso tentando entender o q aconteceu.

¿O q vc pensaria duma coincidência tão descomunal? ¿Pensaria q há uma *intenção* por trás dum fato tão significativo? ¿Acharia q foi um ataque do Príncipe das Trevas em sua eterna guerra contra as forças do Bem? q foi uma reação da natureza contra algo desnaturado? Se vc é devoto de alguma religião, ¿veria um sinal de q teu Deus cansou da decadência de seus líderes e tá enviando um mandato de simplicidade? Se vc é ateu ou agnóstico, ¿de repente se converteria prà religião q sobrou?

Ou ¿apenas ficaria embasbacado por ter testemunhado um evento muito, muito, muito improvável?

Pra simular o impacto de meteoritos, veja este site:

http://www.lpl.arizona.edu/impacteffects/

Numa simulação com um meteorito de rocha porosa com diâmetro de 100m, ele faria uma cratera com diâmetro de 1km e mataria grande parte das pessoas num raio de 5 km do impacto. O interessante é q, segundo essa simulação, durante os últimos 4 bilhões de anos um evento dessas dimensões aconteceu em média a cada 1800 anos – ou seja, mais de 2 milhões de meteoritos do tipo caíram desde q a Terra é Terra. Portanto, a queda de apenas 5 meteoritos desse tamanho durante um único dia não seria um evento tão extraordinário, em particular pq a Terra passa regularmente no sistema solar por regiões coalhadas de meteoritos.

Resumindo: o cataclisma é possível, embora pouquíssimo freqüente na escala humana.

Mas ¡¿como interpretar q os 5 bólidos caiam exatamente no meio de cidades sagradas?!

"Pô," diria um portador do hipoplausivírus, "TEM q haver um significado. Nada acontece por acaso. Alguém TEM q tar querendo dizer alguma coisa. Não é possível q uma coisa dessas aconteça assim do nada."

O mais hilariante é ouvir "nada acontece por acaso". É xente q confunde causa com histórico. Típico de xente q não pensa no q diz. Tipo, 99%. É como dizer q a rua se esburaca "porque ninguém cuida", ou q a pobreza é causada por fatores socio-econômicos.

Probabilisticamente, se caírem 5 meteoritos num só dia, eles podem cair em quaisquer 5 lugares da Terra; as cidades sagradas não são geograficamente especiais de maneira alguma. Então, aparentemente (pra um hipoplausibilético), o cataclisma teria significado pq os locais sagrados já têm significado. Vale lembrar q o cataclisma poderia ter essa magnitude significante apenas pra uma parcela dos seres humanos: os dos últimos (exagerando) 5 mil anos – q, comparativamente, não é tanta gente assim.

Mas prestenção agora.

Não há por q postular a esse cataclisma uma causa significante: se acontecer, aconteceu; se não acontecer, não aconteceu. Mas se vc atribuir o evento a uma causa significante, o Dr Plausível afirma q qqer q seja a causa postulada – intenção benévola/malévola, pulsão culposa/dolosa, &c –, essa atribuição só pode ser pq o cataclisma adquire um significado pra vc DEPOIS de ocorrer, pois não é possível q algo tenha qqer significado ANTES de ocorrer. É hipoplausibilético "deduzir" q, se as cidades sagradas têm significado, então qqer evento fortuito envolvendo essas cidades também tem significado, ou seja, já vem com um significado embutido.

As religiões, enquanto crenças, só têm um significado pq é *esse* o significado q elas têm: o significado de significar: a vaidade de ser vaidoso: o orgulho de ser orgulhoso. Ao sair da escala humana e entrar em proporções planetárias ou galácticas, fica óbvio o caráter vaidoso de toda cosmogonia teísta. o vaidoso é aquele q, ao tropeçar numa pedra, xinga a pedra e é até capaz de imaginar q ela foi posta em seu caminho por maldade alheia. O vaidoso se acha um alvo, e veria o cataclisma como a confirmação de sua alvoidade.

A hipoplausibilose se alimenta da ignorância, de vaidosamente enxergar o mundo a partir da escala própria, da escala humana. Como sempre, a cura prà vaidade é a realidade – a enormidade da realidade.

"Ué," diz o hipoplausibilético terminal, "¿a religião não é justamente a transcendência da escala humana?"

Tsc.

continua...

30 maio 2008

Ogerins orfigrácatos do asarto bleisiraro



A palavra escrita tem um valor ideogramático muitíssimo mais importante do q o valor ortográfico-fonético. Essa é uma percepção aparentemente inatingível pelos reformadores ortográficos. Se o português tivesse continuado a graphar "pharmacia", o Brasil certamente teria, no mínimo, um contigente menor de analfabetos funcionais, um discurso mais inteligente e criativo, e uma chance melhor de aprimorar o padrão de vida.

Se há um tipo de pessoa q causa gargalhadas em nosso equidistante humanista apenas por existir é o reformador ortográfico.

Ô gente cretina.

Digo mais. Imbecil, prepotente, grosseira, metida.

Cretina pq insolente. Um grupo de uns 20 ou 200 tronhos q querem pq querem impor seus preconceitos sobre 200 milhões de outros.

Imbecil pq obtusa. Esses 20 ou 200 tronhos acham q finalmente entenderam como funciona a complexa interação entre cérebro e língua e q, portanto, essa interação é passível de controle mediante decisões exógenas.

Prepotente pq pusilânime. Os tronhos associam-se a deputados e senadores ávidos pra ter algum assunto q justifique seu salário, enfiam-lhes seus preconceitos e idéias cruas, e depois se valem da vantagem covarde de q em oposição a eles não existe e nunca existirá a iniciativa de manter as coisas como estão.

Grosseira pq ignorante. As ortografias díspares (tais como o exemplo extremo do título acima) são um problema perfeitamente contornável pela inteligência, um problema q ajuda a AFIAR a inteligência. Os tronhos, com sua estulta percepção do q constitue um fato lingüístico, enxergam apenas a superfície, a utilidade chã de enfileirar letrinhas.

Metida pq fútil. Os tronhos estão tão entretidos com a Questão Mais Importante da Língua Portuguesa, a Questão q Destrói Reputações e Impede Portugueses de se Entenderem com Brasileiros – a saber, a mísera ortografia –, q descuidam do verdadeiro problema: as imensas lacunas COGNITIVAS da língua portuguesa, a quantidade MASTODÔNTICA de idéias impossíveis de pronunciar, q dirá de grafar, em português de hoje.

Em lugar de afiar a inteligência do portuguesante, de liberar sua criatividade, de expandir seu prazer com as palavras, o reformador ortográfico contribue, junto com o gramático prescritivo, pra emburrecer o falante, pra torná-lo um servo abjeto das formas em vez dum maestro de conteúdos, pra confirmar o jugo da artificialidade troncha das regras, pra atrasar o desenvolvimento da língua, pra infantilizar adultos.

¡Gentalha, gentalha!

28 maio 2008

bosta vejo (2)

O leitorado aqui já sabe q transporte plausível é bicicleta.

Nosso enobrecente humanista, no entanto, às vezes se vê obrigado a compartilhar sua humanidade com o populacho, e aí anda de metrô e ônibus.

Aaah.

Eis q o Dr Plausível sesdias andou de ônibus e logo q entrou no veículo amaldiçoou a empresa Felino Negro. Tinha bostavê. Essa – a pior idéia dos publicitários – já foi espinafrada aqui. Já é hilariante a cretinice de emputecer passageiros, cobradores e motoristas com a prepotência burra de embostear seus ouvidos com anúncios, musiquinhas e outras sandices mal-vindas. Mas qdo o hipoplausivírus ataca, sempre dá pra estupidificar um pouco mais, né? Afinal, imbecilidade é a especialidade de imbecil, né?

E ¿não é q conseguiram? Assim q o doutor passou a catraca, ¿q foi q ouviu? ¿Alguém falando inglês no bostavê?

¿Inglês?

hohoho

Estava passando um trailer de filme com narração em inglês, e umas legendas piquititicas... como se ônibus fosse um mini-multiplex, um ride-in.

HAHAHAHAHAHAHA

¿Pra quê, meu santo, pra quê?

¡Ai miasarma!

E também... Catso, ¿pra quê passar depois um clipe de Britney Spears se esfregando num poste com aquela musiquinha vil pra um ônibus cheio de Dorivais e Valdenices de meia-idade?

E ¿pra quê passar imagens dum caça supersônico ao som dum solo de bateria, enquando a Dona Zeneide sua em bicas e olha o trânsito pela janela?

HAHAHAHAHAHAHA

Ô, Casas Pernambucanas, dá um tempo aí, ô.

26 maio 2008

self-promotion

Em 2001, nosso exabundante doutor passou meses discutindo aborto num fórum da CNN.* Ele defendeu os dois pólos do debate e até sugeriu manobras radicais prum terceiro pólo. Os pitacos dele foram agora editados como texto corrido e serão publicados aos poucos no Dr Plausible, a versão anglófona deste blogue.

The grown-up abortion debate, part 1.

*Foi às vésperas do 11 de setembro; por algum motivo talvez relacionado com o ataque terrorista, todos os fóruns da CNN foram fechados.

24 maio 2008

Falando prettyzinho

 


HAHAHAHAHAHAHAHAHA

E ¿¡¿ISENTO? de agrotóxicos!?

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

14 maio 2008

Apocalices, limitices e outras ices

Man is but mortal: there is a point beyond which human courage cannot extend.
Charles Dickens, The Pickwick Papers


Todo leitor aqui q medita sobre a epígrafe no título deste blogue ("You'll never get any further than plausible.") deve sentir um tremor epifânico no epitálamo, um sensação de sentir algo secularmente sensato, embora refratário à análise. Então agora – só pra ser chato, pois ninguém jamais me perguntou ou parece estar interessado – vou reproduzir aqui as divagações de nosso emoldurável doutor qdo lhe pedi q divagasse sobre.

Parêntese filosófico: (A frase quer dizer mais ou menos "nunca chegarás além do plausível", e é uma versão bem mais avançada da "navalha de Occam" pois aplica a própria a ela mesma. Também é uma versão q torna auto-evidentes as limitações da mente humana e, de fato, de qqer mente possível.)

Quem passa por aqui de vez em qdo sabe q o doutor está sempre falando da ESCALA das coisas, principalmente qdo fala da percepção zonza q muita gente tem qdo fala de princípios morais, regras gerais e outros ditames. Falar da escala das coisas não é pra tentar provar questões usando o reductio ad absurdum. Muito pelo contrário: é destacar o absurdo qdo posto lado a lado com a realidade de q as coisas são, de fato, muitíssimo maiores e mais complexas do q a escala humana individual é capaz de perceber.

A escala humana é uma titiquinha e a gente vive num mundinho, numa aldeia. Quando pensa no porvir, o humano precisa se circunscrever por apocalipses, catástrofes globais ou utopias futuristas q delimitem a imensidão do infinito. Raramente alguém tenta imaginar mais de 10 mil anos à frente. Já nosso estrambótico Dr Plausível, raciocina assim: o Homo sapiens sapiens existe há 200 mil anos, assolado por predadores, micróbios, bactérias, vírus e ignorância; na medida em q aprende a controlar essas mazelas, é razoável então admitir q ele continue existindo por pelo menos outros 200 mil.

Suponha então q nem as projeções ruins nem as boas se realizem: ou seja, q as delimitações apocalípticas ou catastróficas sejam falsas, e q as delimitações físicas sejam verdadeiras: não, o mundo não vai acabar numa apoteose de culpa ou agressão; sim, há limitações físicas intransponíveis prà criatividade: ninguém jamais vai inventar um veículo q levita, um processador mais veloz q o elétron, colonizar Marte, achar uma fonte inesgotável de energia, viajar na velocidade da luz.

Mas sejamos otimistas: suponha q a reserva do q seja *possível* descobrir ou criar tecnologicamente e do q é *possível* organizar socialmente chegue ao fim lá pelo ano 5 mil. Ok, vamos dar um colher de chá: põe aí o ano 10 mil. Nesse ano, ¡pimba!, os humanos já realizaram todo seu potencial.

Sobram 190 mil anos.

Agora imagine 190 mil anos de humanos indo pra lá e pra cá sobre o planeta, refazendo, repisando, reprisando, readaptando, acumulando, repetindo repetindo repetindo repetindo imagens, palavras, histórias, traumas, filosofias, redigerindo hamlets kingkongs frankensteins pernalongas romeus e julietas, recompondo infindavelmente músicas em 3/4 e 4/4, e jogando futebóis e apostando corridinhas e tendo briguinhas e guerrinhas e o escambau a quatro q ainda está por vir.

Diga a verdade: um tremendo porre.

Mas, como de costume, a questão q o doutor quer frisar é outra.

Não há metafísica q transcenda o plausível. ¿Vc, leitor amigo, consegue imaginar as religiões do presente – q hoje têm em média uns míseros três milênios de idade – sobrevivendo à implacável evidência do tempo? Qdo passarem 20 mil anos e nenhum messias der as caras, ¿ainda haverá judeus jurando de pés juntos q ele está quase ali virando a esquina? No ano 30 mil, ¿ainda haverá muçulmanos se irritando com garranchos cômicos representando Maomé? Em 40 mil, ¿ainda haverá espíritas garantindo q cada um dos trilhões de humanos q já existiram até então tem uma alma q paira entre os vivos? Em 50 mil, ¿vc acha q ainda haverá cristãos acreditando no Deus único q através da prece há de salvá-los do inferno no dia do Apocalipse? ¿Ainda haverá alguém q pondere sobre as confusões e o porre e o tédio dos 50 mil anos passados e se disponha a crer em transcendências?

E aí restarão ainda 150 mil anos...

Bleak.

03 maio 2008

A prodenúncia
e o anti-racismo

Nosso esplendoroso doutor deve ser a pessoa menos racista em toda a história do universo e mais três dias: ele trata todos os Homo sapiens sapiens com igual indiferença e indelicadeza – algo q, é claro, não o impede de ser um cara até q legalzinho. É apenas com seus pacientes q ele deixa de lado sua truculência habitual e se presta de corpo e alma ao dever de ser terapeuticamente agradável.
Um desses pacientes é a prodenúncia – ie, a denúncia q, do nada, materializa um crime: o crime passa a existir a partir da denúncia. Por exemplo:

"¡Puxa, como vc tá bonita hoje!"
"¿Tá me chamando de feia?"

Os Euá são um campo fértil pra prodenúncias. Ê terrinha. Vc joga uma sementinha hoje, e amanhã tem uma floresta. Os Euá são uma plantação de prodenúncias. Muita gente tá vendo se vinga no Brasil também – nesta terra onde, adubando, tudo dá. Dentre essas pessoas estão caros amigos do próprio doutor, tadinho. Mas o hipoplausivírus é poderoso e pode temporariamente levar à insanidade contextual até mesmo um grande filósofo.

Umas semanas atrás, a revista Vogue euaense publicou um ensaio fotográfico sobre duas classes profissionais q precisam manter-se em forma: atletas e modelos. Várias dobradinhas atleta/modelo foram fotografadas, e a revista saiu com a següinte capa:



Bastou isso e logologo brotaram prodenúncias pra todo lado. Virou uma baita controvérsia. Gugla aí 'lebron', 'bundchen' e 'vogue' pra vc ver.

Hm.

Então pergunto a meu leitorado: ¿q é q vcs vêem nessa foto? Digam se concordam: de cara, o Dr Plausível viu um jogador de basquete negro vestido de jogador de basquete fazendo pose de jogador de basquete enquanto segura num braço uma modelo loira vestida de modelo fazendo pose de modelo.

Mas... mas... ¿Q foi q viram os prodenúncios euaenses? Uai, q a capa "reforça estereótipos racistas" pois mostra um negro des-Armanizado posando como um gorila irracional e violento raptando a loira q ele intimamente deseja.

HAHAHAHAHAHAHA

Ô miasarma. Impossível resumir o bafafá q se seguiu. Ê terrinha. Centenas de milhares de olhos inocentes – q só tinham visto o q viu o doutor, antes de seguirem seus caminhos lendo gibi – olharam novamente e disseram, "ah é, ó, iii, a foto parece um cartaz do King Kong."

HAHAHAHAHAHAHA

E aí, todos manchados pela inferência pressuposta implícita subentendida, sabemos agora q ainda MAIS uma coisa está fora dos limites: jogador de basquete *branco* em pose de jogo com a boca aberta berrando, segurando modelo branca: pode. A mesmíssima pose, mas com um jogador *negro*: não pode.

¿Quem é racista, então?

O ponto anterior é só um parêntese. O q fez o doutor rachar os dentes de rir foi outra coisa. A prodenúncia fez um trabalho tão insidioso q todos deixaram de lado como desimportante ou indiferente a própria questão q causou a celeuma toda:

¿Tem alguma coisa errada em parecer um gorila? ¿Tem algo de ofensivo numa pessoa olhar pra outra e lembrar dum gorila, tal como alguém q olha pruma nuvem e lembra dum golfinho, apenas pq as duas coisas ãã... se parecem?

Qdo eu era adolescente, meu próprio pai – sangue de meu sangue – me chamava de "poste", pq era branquelo, magrelo e alto. Pessoas q nem me conheciam me chamavam de "girafa" na rua. Olha só uma girafa aqui:



Ô bicho feio. Mil vezes preferível ser parecido com um gorila, ora pois não? E vejam estes outros animais.









Tem os negros q parecem gorilas e tem os q parecem outros bichos:



E também tem japoneses q parecem macacos:



Essa derruba tudo, hem? ¡Japonês q parece macaco! ¿¡Não tem fim, a variedade da natureza!?

¿Preciso dizer mais?
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Na verdade, preciso.

A prodenúncia se aproveita duma brecha semiótica. Vc está sempre usando substantivos e adjetivos. Se vc diz só o substantivo, o prodenúncio denuncia q o adjetivo está subentendido; por outro lado, se vc junta um adjetivo ao substantivo, o prodenúncio denuncia q o adjetivo só está ali pra ser esfregado na cara.

Por exemplo: Ao descrever a capa da Vogue, se o doutor diz apenas "um jogador de basquete e uma modelo", o prodenúncio pode acusá-lo de racismo: "¿Tá vendo? O doutor está tão impregnado pelos estereótipos 'jogador de basquete é negro' e 'modelo é branca' q ele nem enxerga o racismo embutido nessa visão." Se, por outro lado, o doutor diz "um jogador de basquete negro e uma modelo loira", o prodenúncio pode do mesmo jeito acusá-lo de racismo: "¿Tá vendo? Ele deixa claro q o jogador é negro pq não consegue vê-lo como apenas uma pessoa, sem referência a sua cor."

Não há como escapar da prodenúncia. É triste mas é verdade.

Mas há tratamento. A fila nas Clínicas Dr Plausível dá a volta no quarteirão.

16 abril 2008

O racismo entre aspas

Uma discussão até interessante sobre racismo contra o negro no Brasil está sendo travada num blogue aqui perto. Nosso espadaúdo doutor fica ali observando, às vezes ri, às vezes dita algum comentário. Tem tendinite, tadinho.

Muita gente... Aliás, muuuuuita gente... Aliás, TODO MUNDO no Brasil, qdo ouve a palavra 'racismo', confunde 'preconceito contra afro-descendentes' com 'aversão a negróides'. São duas coisas diferentes, e até pode-se dizer q o primeiro é até bastante compreensível (embora politicamente inaceitável) e q o segundo não é tão prevalente como tantos pensam. Deixemos pois q o Dr Plausível ilumine as trevas a q nos relegam as palavras imprecisas, os conceitos tronchos e a percepção embaçada.

Notem uma coisa. Neste artigo digo q "o Brasil é um assentamento europeu – meio interrompido, meio largado, meio improvisado – no limiar entre a Europa e o desconhecido, entre a civilização e as terras de ninguém". O Brasil é primordialmente um subproduto da Europa. Esta cultura em q estamos, esta sociedade, este sistema político, esta tecnologia, este computador, esta mesa, este apartamento, esta roupa, esta língua, esta palavra, esta vírgula, quase tudo q nos cerca se originou na Europa, ou então se originou e foi trazido pra cá por Europeus. Mas praticamente nenhum sistema político, nenhuma filosofia, nenhuma tecnologia, pouquíssimas palavras, nenhum sinal de pontuação se originou na África. De prevalentes no Brasil há algumas religiões, alguns instrumentos de percussão e alguns (sorry, muitos) ritmos. Só.

Há no Brasil três grupos principais racialmente evidentes q não se originaram da Europa ou do Oriente Médio: os indígenas, os africanos e os orientais (ou — como se dizia antigamente — vermelhos, negros e amarelos).

A quase totalidade dos negróides brasileiros são descendentes de escravos. Isso pode parecer um dado importante no desenvolvimento coletivo dos negros brasileiros após a abolição – pois com a abolição o q o governo fez foi dizer, "OK, agora q vc é livre, se vira sozinho; não temos mais nada a ver com teu bem-estar." Mas suponha isto: se a África fosse desde a época da abolição até agora um continente tão desenvolvido, culto, abastado, pujante, produtivo e militarmente poderoso qto a Europa era e é, então os escravos tão ignominiosamente trazidos de lá teriam com certeza uma cultura, uma estrutura coletiva e uma atitude individual muito mais afirmativa. E os negros seriam tbm muito mais respeitados hoje.

Não existe preconceito contra a COR do negro; a cor negra é apenas o indício q identifica as pessoas originárias daquele continente comparativamente subdesenvolvido, inculto, pobre, letárgico, improdutivo e militarmente insignificante. SE o índio fosse um indivíduo alto e bonito, ele não seria ignorado diariamente pelos outros brasileiros. SE a África fosse uma terra cheia de gênios da pintura, de construções majestosas, de urbanizações invejadas, de invenções revolucionárias, de escritores e poetas influentes, de universidades disputadas, então os negróides brasileiros seriam os reis da cocada preta por aqui – toda loirinha ia querer fisgar um pixainho, todo pai de loirinha cogitaria com prazer ter vários netinhos mulatinhos. E não só isso: os negróides teriam uma cultura de referência, um dado unificador muito mais poderoso do q a cor e o passado escravo.

É o q têm, por exemplo, os nisseis. Os nisseis se alimentam diariamente da cultura japonesa, pois estão em contato constante com o Japão. Pode-se objetar q a diferença entre os nisseis e os negróides é q os primeiros não tiveram seus laços cruelmente decepados pelo tráfico. Mas nem isso é muito relevante: a importância dos laços é relativa à importância da origem. O Japão sempre foi mais desenvolvido q a média global, e agora alenta, supre, inspira e serve de modelo pro nissei; se os laços dos escravos não tivessem sido cortados, é bem possível q acontecesse o inverso: os afro-descendentes é q seriam chamados a alentar, suprir, inspirar e servir de modelo prà África. Do jeito q está, pouquíssimos afro-descendentes têm um interesse muito grande pela África. Pergunte a qqer um se acha q teria uma vida melhor em sua região de origem e vai ouvir, o mais das vezes, um rotundo não.

Mas pro negro ou mulato ou cafuzo q se sente discriminado ou incomodado ou ofendido ou traumatizado pelo chamado "racismo" da não tão grande parcela branca do Brasil, ¿q diferença faz tudo isso? Isto é, ¿como isso invalida a percepção de q existe preconceito de cor? Se vc é esfaqueado, ¿q diferença faz se é pela frente ou pelas costas?

Na verdade, faz.

Notem outra coisa. Tudo tem um preço. A Europa não apareceu da noite pro dia. Todo objeto, toda idéia européia custou séculos e séculos de guerras sangrentas, sofrimento atroz, e trabalho dedicado e abjeto. Enquanto os europeus desenvolviam a duras penas os confortos q temos hoje, os africanos continuavam sua vida de silvícolas e lavradores. A origem disso q chamamos de 'racismo' é q o branco (isto é, o europeu) de hoje se sente naturalmente o herdeiro legítimo de todas aquelas conquistas. O branco se sente criando o futuro; o negro, por suas conexões com a África, é a imagem dum atavismo indesejado. É aí, e não na taxa de melanina, q reside o cerne de TODO pensamento ou ato preconceituoso ou "racista" contra o negro. O branco se vê como dando continuidade à história forjada por seus antepassados (no Brasil, até mesmo os mezzo-brancos se definem como brancos por quererem uma fatia da herança européia). Foram brancos os q desenvolveram a ciência de hoje; foram brancos os q decifraram o cosmos, q criaram a democracia, q lançaram os princípios pra quase tudo q há de valorizado hoje em dia. E meramente por acaso, diga-se, pois nada indica q a África jamais conseguiria o mesmo se a Europa não existisse.

O Brasil como um todo paga um preço alto por ser um país periférico e consumidor de idéias importadas, por ser beneficiário do desenvolvimento conquistado alhures. Os negros pagam um preço alto por serem beneficiários dum ramo da história q não lhes pertence.

¿Q deveriam fazer então? ¿pôr o rabo entre as pernas? Claro q não, e pelo contrário. Fora os idealismos cor-de-rosa, a única maneira concreta de eliminar um motivo de preconceito tão profundamente arraigado no subconsciente do branco é trabalhar duro e batalhar com perseverança pra correr atrás do prejuízo acumulado pela África enquanto a Europa e a Ásia se desenvolviam; é GERAR pacientemente uma base concreta pra um orgulho real e fundamentado, não só uma palavra oca tirada dum manual de retórica; é – assim como fez a Europa durante séculos e séculos de frustrações, humilhações e recalques, destruindo-se e construindo-se alternadamente – deixar de querer mamar chorando de barriga cheia o leite derramado.

Somos todos adultos agora.

________________

Adendo:

Notem tbm q, se toda a história da humanidade tivesse sido diferente e a relação entre a Europa branca e a África negra fosse, digamos, a relação entre a Ásia verde e a Austrália azul, com um Brasil importando escravos azuis australianos, então o preconceito neste país seria de verdes contra azuis e todos confundiriam preconceito contra australo-descendentes com aversão a azulóides. Ou, por outro lado, se toda a cultura ocidental fosse negra e o continente atrasado q supriu escravos fosse branco, então o problema todo estaria invertido no vetor negro-branco.

O q o doutor quer dizer é q não existe preconceito contra afro-descendentes descontextualizado da história dos últimos 3 mil anos, pelos menos – talvez 10 mil anos ou mais. É tempo pacas. Num olhar tão longo, é essencial ver primeiro com clareza como a coisa está e como chegou ali; discussões como essa desencadeada pelo Alex Castro se tornam apenas uma série de paráfrases e metáforas da indignação, e demandas de ¡ação já! Só q o problema não será resolvido duma hora pra outra (e justo agora no século 21, que coincidência, não?) com decisões morais, políticas conscientizantes, discussões iluminantes ou um anedotário crescente de injustiças. A humanidade é orgânica: ou seja, TUDO acontece devagar e gradualmente. O problema será resolvido com o tempo, com a evidência suficiente — diária e cumulativa — de q foi POR MERO ACASO, e não por insuficiências congênitas, q os africanos e ameríndios comeram poeira durante a complexificação da civilização. E o acúmulo acontece — só pode acontecer — de baixo pra cima, de pessoa a pessoa, de pai a filho, de geração a geração, entre uma mãe q estimula e um bebê q aprende.

E, na verdade, por mais q racistas e anti-racistas teimem em gerar conflitos e rebuliços, é exatamente isso o q vem acontecendo e vai seguir acontecendo. O racismo de hoje é menor q o de 10 anos atrás, q é menor q o de 20 anos atrás, &c. E não está diminuindo pq cada vez mais brancos ficam indignados ou pq cada vez mais brancos de repente se conscientizam depois de ouvir sermões ou argumentos, e ficam "bonzinhos" da noite pro dia. Está diminuindo pq os próprios negros, ameríndios, mulatos, cafuzos e mamelucos estão aí pouco a pouco crescendo, acontecendo, aparecendo, dando seu plá individual e deixando a seus filhos o legado de seu aprendizado, a influência de suas vitórias e força de suas convicções.

¿Ainda há problemas? Claro. Ainda há pessoas q pensam q a Terra é quadrada.

12 abril 2008

Homenagem



AO
ÍNDIO NACIONALIZADO E PETRIFICADO

Contenta-te, selvagem fraco e tosco:
agora fazes parte dum país
e podes vir compartilhar conosco
teus filhos nus e tuas mães servis.

Riquezas tinhas, mas não suspeitavas,
que são agora a glória do Brasil;
então repousa tuas pífias clavas
pois não terás a escusa do imbecil.

Bandeira tens agora, que não tinhas,
um hino, um rg e um cpf,
o asseio das cuecas e calcinhas
e um cargo muito abaixo de teu chefe.

Contenta-te pois continuas vivo,
que a morte logo vem a quem nos testa;
renega teu status de nativo
e toca a trabalhar em nossa festa.

04 abril 2008

O estômago e a barriga (parte 2/2)

Batatinha, quando nasce,
esparrama pelo chão.

Nicolae Ceausescu


Uma das ditaduras mais tapadas da história contemporânea foi a de Nicolae Ceausescu na Romênia. Com nosso embevecente doutor à disposição ali fazendo pesquisa de campo em sua juventude a poucos quilômetros da fronteira, Ceausescu teve a palurdice de tirar do chapéu a idéia de q a população do país deveria pular de 19 pra 25 milhões duma hora prà outra, raciocinando q, se a produção incansável de bebês pobres havia alavancado a prosperidade em outros países, então nada mais lógico do q incentivar a mulher romena a entornar pestinhas uma atrás da outra. Olha só os incentivos dele:

• se a mulher derramasse 5 ou 6 filhos, recebia a "Medalha da Maternidade";
• se evacuasse entre 7 e 9 filhos, entrava na "Ordem da Glória Materna"; e
• se esputasse 10 ou mais filhos, recebia o título de "Mãe Heroína".

HAHAHAHAHAHAHA

Tem gente q vou te contar, viu.

Aí, em 1966, o ditador arresorveu proibir o aborto, o divórcio e todo contraceptivo pra ver se aumentava a força de trabalho na base da porrada. Mulher q abortasse era presa. Mulher casada q não jorrasse bebês era interrogada. Do outro lado da fronteira, o Dr Plausível gargalhava: "¡Mas esse cara é uma BESTA, sô!"

A proibição durou mais de 20 anos, e é nesse clima (já nos anos 80) q se passa o filme romeno 4 meses, 3 semanas e 2 dias. O filme açambarcou o Plausuto de Prata no 34° Festival de Cinema Plausível de Cotoxó, e portanto tem méritos q nada têm a ver com o debate do aborto. Vale ver, nem q seja pra entender como os canalhas prosperam qdo a hipoplausibilose governa.

Ceausescu – q à época tinha 48 anos e o cérebro já totalmente tomado pelo hipoplausivírus – acreditava q bastaria inflar a população pra q dali a uns 20 anos, ainda durante sua vida, a Romênia o carregasse nos ombros como o visionário q transformara o país atrasado, chato e macambúzio num paraíso progressista e iluminado, cheio de gente feliz.

E quis fazer isso proibindo o aborto.

HAHAHAHAHAHAHA

Antes da proibição, a Romênia não dispunha de pílulas ou outros métodos certeiros de contracepção; mas, vejam só, o aborto era legal e barato. Obviamente – país pobre –, havia 4 vezes mais abortos do q nascimentos. Mas no ano seguinte à proibição, os nascimentos dobraram; e, também obviamente, começaram a decair até q dez anos depois viriam a se estabilizar na taxa de antes da lei. Os motivos, claro, foram q (1) os abortos continuaram, embora ilegalmente, e (2) mais mulheres morriam em conseqüência de tentativas de aborto por amadores.

Mas aí, 6 anos depois da lei, o sistema educacional romeno começou a entrar em colapso pois havia mais crianças do q lugares nas escolas. 20 anos depois da lei, a crise se exacerbou pois as pessoas "a mais" q nasceram no surto entre 67 e 69 começaram a gerar seus próprios filhos. A Romênia ainda não se recuperou do impacto.

HAHAHAHAHAHAHA

¿Não é de esbanguelar a dentadura de rir?

¿Não teria sido muitíssimo melhor prà economia romena se a contacepção e o aborto continuassem disponíveis e q os casais pudessem ter uma vida mais produtiva, mais participante e mais inteligente, decidindo eles mesmos se queriam ter zero ou um ou dois ou três filhos?

E ¿já não era hora de os economistas, dirigentes e outras pessoas armadas, de lá e de cá, finalmente reconhecessem q a economia não precisa "crescer", q na verdade não "cresce", q só aumenta junto com a população de gente pobre, e q um objetivo muito mais salutar e realista é q a economia apenas melhore o q já existe?

Então.

¿Qdo é q vão legalizar e disponibilizar o aborto nesta joça?

20 março 2008

O estômago e a barriga (parte 1/2)

Entre as coisas q mais divertem nosso espanipelágico doutor (qdo sobe à tona) está a intersecção entre natureza, cultura e economia. É uma esquina em q acontece toda sorte de engarrafamento hipoplausibilético. Não há marronzinho q agüente; não há semáforo q organize.

Um dos engarrafamentos mais comuns é o problema da mulher grávida q procura emprego.

Em 1969, o Dr Plausível introduziu nos Cadernos de Plausibilática uma coluna pra meter o pau nas partes femininas da legislação trabalhista. Os penetrantes artigos q inseriu ali jamais geraram rebento algum, e o pateticamente estéril projeto foi finalmente abortado.

Observe o q AINDA acontece. A licença-maternidade hoje dura 120 dias. Por lei, uma candidata a emprego não pode ser obrigada a fazer teste de gravidez. Essa lei foi implementada pra evitar q o empregador rejeite preventivamente o prejuízo futuro de pagar salário por 4 meses a alguém q não está trabalhando. A posição do empregador é totalmente compreensível.

Só q... passados alguns meses, não dá pra esconder gravidez. Uma mulher visivelmente grávida q procura emprego é entrevistada normalmente, é indagada sobre sua experiência, é informada sobre a vaga, tudo bonitinho, mas JAMAIS consegue o emprego. A hipocrisia é instituída pela lei: o entrevistador não pode informar a barriguda q "necas de pitibiribas, não temos interesse em teu estado interessante" pq negar emprego explicitamente por causa de gravidez é uma contavenção punível.

¿Não é gozado? O errado não é fazer a coisa, mas confessar um motivo. E mais gozado ainda pois, novamente, o motivo do empregador é totalmente compreensível.

Mas o MAIS gozado (tristemente) é a situação da grávida. Ela é legalmente impedida de abortar mas, incoerentemente, tbm pode ser impedida de ter uma vida independente e decente. No entanto, a decisão de abortar é tão compreensível qto a decisão do empregador: ¿por q cargas d'água um indivíduo deve ser incriminado se age segundo suas necessidades?

Se a lei contra o aborto é uma instituição estatal – q obviamente existe não por motivos religiosos mas pq em tese o aumento populacional fomenta a economia* –, então deveria recair sobre o estado um ônus compesatório: a mulher grávida desempregada deveria ser amparada e paga pra ter o bebê. Afinal, isso aqui não é a Romênia de Ceaucescu**.

Ou então, libera o aborto aí, meu.

________
* E não me venha com religiosismos; o aborto só foi e é moralmente estigmatizado pq creu-se e crê-se q assim é melhor prà economia.
** Mais sobre isso na 2ª parte.

15 março 2008

Criâncias...

Não admira q as línguas ibéricas tenham uma taxa baixa de criação de novas palavras. Entre os portuguesantes, por exemplo, esquece-se a origem das existentes a uma velocidade assustadora. Ou seja, a criação de palavras novas é inibida pelos meandrosos processos de germinação vocabular: quase toda palavra nova parece invencionice.

Nosso epigramático doutor ilustra a questão transetimologicamente.

criança = criância = processo/ofício de criar [breed]
entrar = passar a uma posição 'entre' [between] (quatro paredes, &c)
gramado = terreno onde se plantou grama [grass]
enfrentar = ir em frente, pôr-se em frente [in front]
desprezo = negação de valor, de preço [price]
arquibancada = conjunto assentos [bench] perante algo

The breedance betweened inthe grassed and infronted the dispricing ofthe arch-benched.

08 março 2008

Aversão oficial

"Este é um país consentido."
do nobre colega Dr W Sesana

Nosso eqüipendente Dr Plausível diz a verdade, doa a quem doer, mesmo q o dolente seja ele mesmo. Sesdias, me confessou algo q me deixou estupefacto — ainda mais porque era visível e comovente seu sofrimento ao manter-se inabalavelmente fiel a sua dedicação à verdade.

Disse q estava almoçando num restaurante qdo sentaram-se à mesa ao lado um deputado paulista e outro sujeito. Via de regra, qdo acontece algo do gênero, vira matéria pra gargalhadas já q político em restaurante fala alto e nosso efetuoso humanista, por princípio, não acredita N-U-M-A P-A-L-A-V-R-A dita ou escrita por ou de outro modo saída de qqer político por qqer partido em qqer ocasião sobre qqer assunto.

Mas dessa vez, algo fenomenal aconteceu q levou o Dr Plausível a rever seus princípios e admitir q, às vezes, em circunstâncias muito especiais, dentro de situações controladas e verificáveis, um ou outro político é capaz de dizer algo remotamente crível.

O incidente foi qdo o deputado, após se sentar e aspergir algumas inverdades, de repente se distraiu e disse, "Peraí q eu vou ao toalete.", se levantou e saiu em direção ao dito cujo.

Nosso doutor não viu se ele entrou no toalete ou não. E foi aí q a pontada de crença penetrou seu coração. O doutor acreditou q o deputado realmente foi ao toalete. Por alguns minutos, sua intensa dor de acreditar na declaração dum político só foi levemente mitigada por um cagagésimo de esperança na raça humana.

O sistema imunológico enfraquecido deve ser a velhice chegando.

27 fevereiro 2008

MPB*

*Mitomania Pomposa Brasileira
_________________

Este é o "monumento" (em Hereford) a Edward Elgar...



...q compôs isto:



E aqui, uma parte do monumento (em São Paulo) a Carlos Gomes...



...conhecido mormente por ter composto isto:



O monumento a Carlos Gomes também foi homenageado neste vídeo...



...onde se nota q a música de Carlos Gomes é tão poderosa e emocionante q puseram na trilha sonora um choro de Pixinguinha.

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

Não é pra espezinhar, não. É q a hipoplausibilose fincou raízes profundas no Brasil, e um choque de realidade, de proporção, é sempre sadio, não? O objetivo de nosso engrandecente doutor é invariavelmente a terapia, a cura e o estímulo.
________________

• Adendo 1:

Já q falo de proporção, escala humana, &C, veja abaixo uma panorâmica da estátua de Elgar.


________

• Adendo 2:

E falando de ópera, tem Richard Wagner, né? Dá licença, né? Olha aqui o monumento a ele em Berlin:



¿Entende o q diz o doutor sobre a ESCALA das coisas?

17 fevereiro 2008

São Papudo (2)

Admito q às vezes é um pouco incômodo ouvir rádio perto de nosso estradivário doutor. Sesdias, ouvindo na CBN umas entrevistas sobre o aniversário de São Paulo – ocasião em q vulgarmente se deslínguam as mais disparatadas declarações sobre este local esquecido pelos deuses –, um conhecido jornalista, notório pelas listas q publica, desbocou-se a falar da fabulosa maravilha q é compartilhar a mesma cidade com outras 20 milhões de pessoas.

HAHAHAHAHAHAHA

Na verdade, qdo alguém diz q “ama São Paulo de paixão”, há q desconfiar um eufemismo e entender apenas “é aqui q eu moro” ou também “o resto do Brasil é uma bosta”. Porque, né?, dá licença.

Muitos anos atrás, o Dr Plausível vendia um remédio q atenuava os efeitos loquazes da hipoplausibilose em entrevistas na mídia. O remédio chamava-se Moscadol® (“Em boca fechada não entra Moscadol®.”). Desnecessário dizer, em vista do q se ouve por aí, q o Moscadol foi um rotundo fracasso de vendas.

O caso do jornalista listador foi um exagero típico. O sujeito se vê tomado por um arrebatado ardor por dizer algo ao mesmo tempo anódino e criativo, um frenético arroubo por ver a questão dum ponto de vista ao mesmo tempo inusitado e confortante, e aí... diz q é super legal, q é jóia, q é uma maravilha sublunar juntar 20 milhões de pessoas vagamente ignorantes, profundamente egoístas e fatalmente mal-educadas numa área mínima e malpropícia, desprovida de belezas naturais, no centro duma cultura improvisada.

O Moscadol® anularia a metralha de besteiras, mas é claro q a causa é mais profunda e só seria anulada num longo e penoso tratamento apoiado em Plausibilol®. O conhecido listador sofre da mesma variante da hipoplausibilose q faz garotas descerebradas desejarem encontrar "um homem sincero" e pessoas-q-vivem-de-luz afirmarem q "não comem nada". Ele acha lindo porque imagina essas 20 milhões de pessoas como gente bonita e descolada num caldeirão cosmopolita de múltiplas vertentes e possibilidades de interação cultural. glófglófglóf Pobre homem. Isso q dá ler demais. Bastaria colocá-lo no meio duma justa e real amostragem da gente barraquenta suja barulhenta feia fedorenta e burra q compõe qualquer agrupamento humano e ele logo-logo se internaria numa Clínica Dr Plausível.

Aliás, olhe bem a foto abaixo e tente dizer em voz alta q ama São Paulo. Se conseguir, apenas confirma q não existe gente sincera.

01 fevereiro 2008

Alvará

Em toda sua fecunda vida, nosso extrapolante doutor jamais viu mais de 10 minutos de carnaval por ano. Pode parecer q ele é um austero portador de gastrite; mas, embora viva tendo dor de barriga, é de rir.

Desta vez foi a celeuma essa da proibição dum carro alegórico no carnaval carioca.

Veja aqui, q achei aqui.

¿Não é de esparramar a muxiba de rir?

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

Tenha dó, gente.

Vêm uns caras e juram de morte os autores de uns cartuns com Maomé. Vêm outros e proíbem q desfile um carro alegórico engraçadíssimo q ridiculariza o nazismo com mais eficácia do q qqer coisa q já veio antes (inclusive Chaplin brincando com o globo). E ¿o motivo é q "a mensagem poderia ser interpretada de maneira errada pelo público"? E q ¿¡¿"carnaval ... não é o espaço certo para a discussão desse tema"?!?

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

Claro, não tenha dúvida alguma, dona-de-casa. O público ia pensar q a Viradouro está promovendo o nazismo e a matança de mais 6 milhões de judeus, não é verdade? Pois o "público" ¿não é esse povo imbecil q perde a noção do q está fazendo toda vez q vê uma suástica?

"¡Olha lá uma suástica! Oh... oh... Nossa, ¿por que minha roupa tá rasgando? ¡¡Tou virando o Hulk!! GLUÁGLUÁGLUÁGLUÁGLUÁ ¡¡¡Olha lá um gay judeu preto milionário!!! MORRE MORRE MORRE GLUÁGLUÁGLUÁGLUÁGLUÁ"

Claro está também q se o desfile da Viradouro não fosse embargado por um
grupo judeu, teria q ser embargado por alguma ONG exterminadora de mau gosto. O tema escolhido foi "É de arrepiar". Aí os sambistas viradoidos se juntaram e pensaram,

Joquinha do Ariri: Xovê... ¿O q é q é de arrepiar? Hmmm...
Moscão: ¡Sexo!
Joquinha do Ariri: Boa. Podemo fazer um carro alegórico com... com umas camas, assim...
Vasquinho da Rapeize: Cama, cama... [pausa] ¡Kama Sutra, Kama Sutra!
Joquinha do Ariri: Genial. Registra a idéia aí no papel. E ¿q mais é de arrepiar?
Moscão: hmm....
Vasquinho da Rapeize: ããã...
Aldenilde Sá: Ó, não sei de vocês, mas eu fico arrepiada com barata.
Joquinha do Ariri: ¡Genial, genial! Escreve aí.

E assim por diante, com o resultado q se planejou o desfile da Viradouro com oito carros alegóricos com temas "ligados ao arrepio" – entre eles: o frio, o Kama Sutra, o holocausto, o nascimento e... as baratas.

HAHAHAHAHAHAHAHAHA

Esse desembeste do pensamento voando pra todo lado pode ser a coisa mais normal em carnaval – e o Dr Plausível admite q conhece pouquíssimo do assunto. Mas tinha q ser um carioca pra inventar um desfile desses. O doutor acredita q a coisa mais maravilhosa do carioca e de seu carnaval é sua inconsciência praiana, seu talento folgazão pra boiar na superfície acima de todos os escuros e horrendos emaranhados de intrigas abissais no mundo real. É muito triste q venha gente lá do outro lado do espectro emborcar e lançar às profundezas de seu emaranhamento uma simples molecagem de mau gosto, impedindo q o "público" chegue a suas próprias conclusões.

Esse Hitler realmente foi um babacão. Por causa dele, agora há q impetrar à antissepsia judaica o direito de me privar de formar uma opinião sobre o assunto pífio dum carro alegórico. Êitcha.

Mas o pior é q a escola de samba gastou uma grana preta com o projeto e construção do carro, e não é a primeira vez q uma liminar embarga um desfile. É como construir uma casa e depois ser obrigado a demoli-la porque não atende a normas de construção civil ad hoc. Não parece justo q a legislação não inclua em seus códigos e normas precisamente o quê pode ser feito ou dito. Se pra construir uma casa é preciso um alvará de construção, então acho q, pra construir coisas como um carro alegórico, a lei deveria incluir o requerimento dum Alvará de Inocuidade q fosse vistoriado por um padre, depois por um sacerdote, e aí um mulá, um dervixe, um rabino, um monge, um druida, um xamã, um dalai-lama, um presbítero, um capelão, um zaco, um abdalá, um pai-de-santo, um pastor, um agapeto, um imame, um alfaqui, um bonzo e um pajé.

Oh... ¡¡Mas isso seria censura, não?! Q HORROR! Q HORROR!

30 janeiro 2008

"Eu, gênio."

Hitler deve ser o sujeito com a pior fama em todo o universo. É a personificação do Mal.

Mas, na verdade, pessoas como nosso estiloso doutor sabem q "o Mal" não é tão ruim assim. Uma pesquisa qqer, de qqer tamanho, há de revelar q as pessoas identificam o Mal com uma intenção de causar dor ou de fazer outras coisas desagradáveis tais como destruir o q já está pronto. Mas, dado q se procura combatê-lo com preces, esperanças e "o poder do amor", ninguém deve levar o Mal muito a sério. No mínimo, não é tão temido ou detestado qto se quer fazer crer. Hitler é considerado mau não porque tivesse intenção de fazer o Mal, mas porque agiu com indiferença e foi, em retrospecto, incompetente.

Ninguém teme o Mal tanto qto teme a Indiferença. Ninguém detesta o Mal tanto qto detesta a Incompetência. Não fosse assim, ¿por que cargas d'água teria surgido a eugenia?

Até um paracelso do darwinismo como Richard Dawkins chegou a dizer q Hitler, além de tantas maldades, também teve a desfaçatez de desabonar a eugenia. Pra Dawkins, a equação pós-Hitler q ficou na cabeça das pessoas é:

Hitler = o Mal
Hitler = eugenia
portanto, eugenia = o Mal

Um sujeito inteligente como Dawkins não cometeria a estultícia de aventar a eugenia seriamente. Mas, como biólogo, ele não acha essa uma idéia tão ruim. É antipática, desagradável, mecânica e idealista, mas não de todo ruim. Pois ¿não é eugenia o q se faz com os rebanhos, os bichos de estimação e os vegetais? Se existe o objetivo e a esperança – com a qual gente tão desenganada como Freud morreu e morre – de "uma vida melhor" no futuro, ¿por que não já garanti-la ceifando na raiz "a origem de todo o Mal", isto é, "as gentes de baixa qualidade"?

O Dr Plausível, claro, cai no gargalho. A eugenia como método acabaria sendo só mais um passatempo humano, tal como as religiões e as ideologias políticas – nas palavras de Arundhati Roy, "an obstacle race, with a prize at the end". Mas, embora risível, não é essa a característica hilariante.

Hilariante é q instituir a eugenia é totalmente desnecessário. Basta estigmatizar o estupro: homens e mulheres, em suas próprias escolhas, já promovem a eugenia conscientemente e de comum acordo; o estupro é a única situação em q o desejo eugênico bilateral é contrariado por uma das partes. E embora as mulheres disfarcem suas imperfeições sob a maquiagem, a roupa e a plástica, e os homens disfarcem as suas sob a organização, o método e a hierarquia, e muito embora o jogo da sedução seja, como sempre foi, um palco de enganações, fingimentos, bom-mocismos e hipocrisias, a natureza se encarrega de eugenizar a população bonitinho e com mais eficácia do q qqer racionalização a priori conseguiria.

Em resumo: os indiferentes e os incompetentes – não os maus – vão sendo ceifados, implacavelmente.

21 janeiro 2008

Sucho de frutha em thela de cinemha

The silly people don't know their own silly business.
Henry Higgins, in Pygmalion, GBShaw


Tá cada vez mais impossível ir ao cinema com nosso esfuziante doutor sem passar alguns momentos gargalhando. Se não é o preço do ingresso, é o da pipoca; se não é no trailer, é na publicidade pré-filme; se não é na primeira metade do filme, é na segunda. Vou te contar, viu. Alguns cinemas já nem se incomodam de passar os trailers: passam logo a publicidade, na certa porque paga mais. Ou seja, é q nem tv a cabo: vc paga os olhos da cara pra ver anúncios. O doutor já cancelou a tv a cabo, mas ainda vai ao cinema. Logologo vai desistir também do telão e virar usuário de pirataria.

Sesdias, sua liberdade de escolha foi funestamente pisoteada por um anúncio desse suco-novo-igual-aos-velhos — Fruthos. O doutor desandou a rir e gargalhar e expectorar e, é claro, o cinema todo riu junto... e, é claro, pelo motivo errado. Veja o estopim aqui:



¡Ô miasarma! ¡¡Ôôôôô miasarma!!

É assombroso o estrabismo desse anúncio. Tira sarro de gente q não pensa e está obviamente dirigido à mesma gente q não pensa. É o mesmo q dizer:

"Ô idiota, deixa de ser idiota seguindo as modas inventadas por nutricionistas. Prefira ser idiota seguindo a moda inventada por NOSSO nutricionista."

HAHAHAHAHAHAHAHA

E ¿¡¿¡¿"frutas colhidas com todo carinho"?!?!?

HAHAHAHAHAHAHAHA

Acho q ninguém nasceu ontem, né? Imagina se o peão vai colher a laranja "com todo carinho", puxando do galho delicadamente pra não machucar a árvore, deitando a fruta numa caminha de cetim acolchoado... aiaiai... "Frutas colhidas com todo carinho"... êitcha. ¿Pra q catso serve uma frase dessas num comercial de suco industrializado se não pra estimular a idiotice do público?

A mensagem é tão despistada q talvez os próprios criadores do anúncio... ãã...

Deixa pra lá.

E ¿q catso tá fazendo esse H no meio de Fruthos? aiaiaiaiaiaiai

AI AI AI AI AI AI AI

Mas é sério, leitor. Pra quem já leu The Omnivore's Dilemma, de Michael Pollan, não há de escapar a cretinice do anúncio ao contrapor produtos naturais como alho, brócolis e peixe a um produto industrializado q — além do suco concentrado de praxe mais uma quantidade cinicamente viciante de açúcar — contém acidulante, estabilizante, antioxidante, nossa velha conhecida água e um composto tetricamente chamado de "aroma idêntico ao natural" — ou seja, um suco igualzinho a todos os outros sucos industrializados da prateleira q, pelo menos, não insultam a inteligência do povão.

Vida curta.

02 janeiro 2008

Troppi cuochi

Reunião familiar de fim de ano é qdo nosso elucubrante Dr Plausível fica meio largadão ali no canto da sala bizoiando a biblioteca da parentalha. Parente pode ser aquela água toda, mas poucas coisas há neste mundo injusto melhores q gargalhar honestamente com irmãos, primos e cunhados. Sesdias o doutor tava lá com uns parentes q assinam a Folha, todos exímios cozinheiros, e passou ótimos momentos gargalhando em família em volta duma amostra grátis q a Folha enviou duma coleçãozinha de receitas com o imaginativo, criativo e evocativo nome Cozinha de País a País.

O livreco em questão intitulou-se Itália 2 — ou seja, é o 2° volume dedicado à cozinha Italiana.

Mas, mas... receitas de ¿musse de damasco? (francês com chinês) ¿¿gazpacho?? (espanhol) risoto ¿¡¿ao curry?!? (indiano) O doutor chamou a parentalha em volta e daí em diante foi só risada.

Logo na intro, o texto já solta aquele cheiro de minestrone requentado de soborô insosso e mal cozido.

Veja esta amostra, sobre massa de macarrão:

A história ensina que as primeiras versões de massa a partir do cozimento da mistura de farinha e água, são do século 490 a.C. (1) ... Esse alimento mágico (2) rapidamente se difunde a ponto de, na Idade Média (3), revelar o status social de seus apreciadores (4). As massas frescas e recheadas eram típicas nas mesas dos ricos, enquanto as secas e planas ... eram encontradas nas mesas dos pobres. Apesar de tudo (5), um alimento revolucionário (6) e ao alcance de todos.

(1) Na verdade, o q a história ensina é q os chineses já comiam espaguete 2 mil anos a.C.

(2) ???? Súbito aparecimento do locutor da Globo.

(3) De 490 a.C. até a idade média são uns 1500 anos; ¿isso é "rapidamente"?

(4) Tipo, um pedreiro faminto de Sorrento comendo macarrão pq é barato e fácil de fazer virou "apreciador".

(5) O doutor e a parentalha ficaram vários minutos tentando entender o q é "apesar de tudo" nessa frase; ¿apesar de tudo o quê? ¿apesar de "revelar o status social"? ¿apesar de ser comido por ricos e pobres? ¿Q catso?

(6) HAHAHAHAHAHAHAHA Um alimento com uma tradição de uns 1500 anos devia parecer revolucionaríssimo na Idade Média. O próprio Marxcarrão.

Agora vejam estas delícias. Animam qqer jantar.

salada vegetariana de arroz
... Esta receita pode ser feita com arroz arbóreo ou com arroz comum, mas, se a ocasião for um dia especial, deve-se usar o arroz parboilizado.
HAHAHAHAHAHAHA
Ou seja, se for uma ocasião comum, use arroz arbóreo; mas se for especial, use um arroz q qqer restaurante a beira de estrada usa.

salada morna de couve-flor:
... Apesar de não ser originária da Itália, esta criação contemporânea é muito apreciada pelos italianos...
E apesar de não ser originária da Itália, é justamente por ISSO q foi incluída neste volume de cozinha italiana, capice?

nhoque com camarões
... a batata, q é outro ícone da cozinha italiana...
... E da alemã, da inglesa, da portuguesa, da boliviana, da canadense, da brasileira, da chilena...

tamboril com cítricos
... Ao contrário de muitos peixes, o tamboril não tem escamas...
É. Ao contrário dos muitos peixes q não estão entre os muitos peixes q NÃO têm escamas, o tamboril TAMBÉM não tem escamas.
Aliás, ¿esse "muitos" peixes dá a impressão de
a) mais de 50%, ou
b) menos de 50%?
Costuma ser menos pois, senão, dir-se-ia "a maioria dos peixes", não?

camarões aromáticos
... O camarão é um produto raro na Itália...
Mas tem tanto, mas TANTO italiano pedindo camarão qdo viaja pro exterior, cara. Nem te conto.

peru colorido
... Muito adequada a almoços informais que reúnam gente jovem e alegre...
¿Quê? ¿De volta aos anos 50?
"Ei, tchurma, já q somos um grupo de gente jovem e alegre, ¿q tal almoçarmos um peru colorido?"

musse de damasco
... O damasco é uma fruta originária da China e do Oriente Médio ... agrega sabor a esta musse...
Tendi. Vc pega uma sobremesa de origem francesa, coloca uma fruta chinesa e ¡presto! ¡pimpoglione! ¡sparadrappo! Sem falar q o damasco "agrega" sabor a esta musse q JÁ É de damasco...

frango à siciliana
... Atualmente, a Sicília é um dos maiores produtores de frutas cítricas (laranja e limão) do mundo. Estas frutas dão um toque de requinte a este frango...
¿Requinte? O Brasil é o segundo maior produtor de bananas do mundo. ¿Esta fruta dá um toque de requinte ao picadinho?

E por falar em banana...

torta de banana à italiana
... Na Itália, a banana é produto raro...
E é por ISSO q figura tão visivelmente na culinária italiana.

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O doutor tem um pouco de dó de jornal q tenta alavancar as vendas com ofertas desse tipo. E tem mais dó ainda da imprensa brasileira, q (como já se disse aqui) aparentemente não tem idéias, não tem redatores, não tem iniciativa. O comentário q fiz no início sobre o nome dessa coleçãozinha é mais sarcástico do q parece à primeira vista, pois a "Cozinha de País a País" é adaptada da idéia, redação e iniciativa do jornal espanhol El País. A Folha nem sequer teve a presença de espírito de adaptar o trocadilho do título (na Espanha, o leitor recebia um número da coleção a cada edição de domingo de El País — portanto, "Cocina de País a País").

Claro q a Folha não é o único jornal a enfiar gororobas editoriais goela abaixo dum público apéptico, sob a desculpa de "cultura" ou "informação". É apenas um exemplo. E fica bem evidente do quê é exemplo qdo se compara o produto ao eslôgã enganoso q o promove: (grifos meus) "Qualquer um vai poder ser especialista na culinária de qualquer país." Mesmo descontando o zeitgeist do Ratatouille, alguém no caminho entre a idéia original e o produto final obviamente agiu de má fé. Se não isso, então grande parte dos vários intelectos por trás dessa coleção e promoção ingenuamente desacreditam na capacidade q um texto seu tem de não significar nada.